Um médico que prestava serviço em um hospital de Ceará-Mirim foi absolvido da acusação de ter cobrado para realizar procedimento cirúrgico em paciente do Sistema Único de Saúde (SUS). A decisão é do juiz Herval Sampaio Júnior, da 1ª Vara da Comarca de Ceará-Mirim. Para o magistrado, o Ministério Público, autor da ação penal, não conseguiu comprovar que houve a prática do crime. Tanto o depoimento do profissional de saúde quanto o da paciente demonstraram que os fatos não ocorreram como narrou a promotoria na denúncia.
Para o magistrado, apesar de o Ministério Público ter concluído em suas alegações finais que houve um “aproveitamento da situação de vulnerabilidade da paciente para cooptar pacientes particulares através do ambulatório do SUS”, não se constituiu provas nos autos de que realmente o denunciado exigiu vantagem indevida dela. Além disso, pela prova juntada aos autos não se pode deduzir que acusado praticou o verbo do tipo penal do art. 316 do Código Penal (concussão).“De fato, não se demonstrou na prova colhida que acusado tenha exigido vantagem indevida para realização do procedimento. Pelo contrário, no depoimento judicial (…) ela afirmou categoricamente que o denunciado não lhe cobrou nada, ou seja, não fez exigência de vantagem indevida. O caso em análise não é equiparável a situação na qual médico, na condição deservidor público, exige valores das vítimas para realizar procedimento cirúrgico custeado pelo Sistema Único de Saúde.
Neste hipotético episódio, haveria sim a prática do verbo do tipo penal do art. 316 do Código Penal. Porém o caso em exame é diferente. Não houve a exigência de vantagem”, destaca o julgador.No depoimento, a paciente disse que, “em momento nenhum ele (o denunciado) cobrou nada, a única coisa que lembra, porque faz muito tempo, que ele (o denunciado) não quis fazer a cirurgia com o material que o SUS fornecia na época, ele queria fazer a cirurgia com material que ele (o acusado) estava pedindo, somente isso e nada mais”, relatou.Disse a mulher que foi atendida pelo médico. Este indicou a realização de uma cirurgia e que esse procedimento seria feito pelo SUS. E que não fez a cirurgia porque o SUS não disponibilizava o material que ele (o denunciado) estava pedindo e que ela (a depoente) chegou a ajuizar uma ação na Justiça para conseguir esse material e que não se recorda de documentos que falava que os honorários médicos seriam pagos diretamente a ele (acusado), em razão dos honorários do Sistema Único de Saúde serem muito baixos.Complementou “que ela não ia pagar nada para o médico, que seria tudo pelo SUS. Que não se recorda sobre o orçamento de R$ 21.000,00, que na época, ela (depoente) não lembra que teve dinheiro no meio, o problema seria só o material para a cirurgia e que entrou na justiça para conseguir o material que ele queria, que não fez a cirurgia porque nunca foi liberado até hoje”.
Ao propor a ação penal, o MP afirmou nos autos que o médico, “olvidando-se completamente de seus deveres éticos como médico atuante no Sistema Único de Saúde, condicionou a dispensa de tratamento cirúrgico à paciente à realização de procedimento por ele ditado, mais oneroso, em estabelecimento particular, que não estava previsto na Tabela SUS”.E que o acusado teria exigido, para ele e outras pessoas, vantagem indevida – honorários e custos da cirurgia particular – no valor aproximado de R$ 21.000,00, sendo que desse valor, R$ 3.000,00 seriam destinados “ao próprio denunciado e que o acusado desobedeceu expressamente aos Protocolos do SUS para tratamento da moléstia da paciente, indicando exclusivamente tratamento particular, fora da rede SUS”.Para a promotoria, ao agir dessa forma, o médico cometeu concussão, que é, segundo o artigo 316 do Código Penal o ato de exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida. Tese não acatada na apreciação realizada em primeira instância.