| 26 maio, 2020 - 15:00

Verbas trabalhistas devem ser partilhadas quando o casal se separa?

 

Entre os artigos 1658 a 1688, o Código Civil disciplina os regimes bens

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Por Rodrigo Leite

Entre os artigos 1658 a 1688, o Código Civil disciplina os regimes bens: nos artigos 1658 a 1666 está regrado o regime mais comum, o de comunhão parcial de bens; nos artigos 1667 a 1671 é disciplinado o regime de comunhão universal de bens e nos seguintes, o regime de participação final nos aquestos (arts. 1672-1686) e o de separação de bens (arts. 1687 e 1688).

Segundo o art. 1658 do CC, “no REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com as exceções dos artigos seguintes.” Nos artigos seguintes, o Código lista bens que são excluídos da comunhão (art. 1659) e bens que ingressam na comunhão desse regime de bens (art. 1660).

Excluem-se da comunhão (art. 1659): os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; as obrigações anteriores ao casamento; as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Entram na comunhão (art. 1660): os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

O regime de bens seguinte previsto no Código é o da comunhão universal. O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL (arts. 1667 a 1671) importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, COM AS EXCEÇÕES DOS SEGUINTES: bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; os bens mencionados nos incisos V a VII do art. 1659.

Em linhas gerais, o STJ entende que no regime de comunhão parcial de bens – ante a presunção do esforço comum dos consortes na construção da vida conjugal –, os frutos e rendimentos percebidos na constância do casamento são comunicáveis (AgInt nos EDcl no AREsp 908.313/SP, Rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 04/05/2020, DJe 06/05/2020).

Mas daí é possível entender ou extrair que verbas obtidas após um litígio trabalhista também ingressam na comunhão?

Segundo o art. 1659, VI, não se comunicam (excluem-se da comunhão) “proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge” e, por isso, estarão excluídas as verbas advindas do trabalho de cada indivíduo. Assim, por consequência, as verbas trabalhistas que decorrem (decorreram) dos “proventos do trabalho pessoal” também estariam excluídas.

O STJ, contudo, não entende assim. Numa aparente colisão de dispositivos (arts. 1659, VI versus art. 1660, I), a Corte dá prevalência ao art. 1660, I, do CC, para considerar que as verbas trabalhistas são “bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso” e, por isso, entram na comunhão.

O STJ entende que nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens comunicam-se as verbas trabalhistas a que se tem direito na constância da sociedade conjugal, devendo ser partilhadas quando da separação.

Trata-se de tema uniforme na Corte: nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens, comunicam-se as verbas trabalhistas correspondentes a direitos adquiridos na constância do casamento, devendo ser partilhadas quando da separação do casal (AgInt no AREsp 1405108/PR, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 04/11/2019, DJe 11/11/2019).

Salienta-se que as verbas trabalhistas são “correspondentes a direitos adquiridos na constância do casamento” (AgInt no AREsp 1320330/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 07/02/2019, DJe 19/02/2019).

Compreende-se que no regime de comunhão parcial ou universal de bens, o direito ao recebimento dos proventos não se comunica ao fim do casamento, mas, ao serem tais verbas percebidas por um dos cônjuges na constância do matrimônio (como verba decorrente de litígio trabalhista), transmudam-se em bem comum, mesmo que não tenham sido utilizadas na aquisição de qualquer bem móvel ou imóvel (arts. 1.658 e 1.659, VI, do Código Civil) – AgRg no REsp 1143642/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 26/05/2015, DJe 03/06/2015. Nesse processo, o STJ admitiu comunicabilidade dos saldos bancários advindos de verba trabalhista e aposentadoria.

Tal raciocínio também é aplicado nas uniões estáveis: “as verbas de natureza trabalhista nascidas e pleiteadas na constância da união estável comunicam-se entre os companheiros.” (AgRg no REsp 1063533/RN, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 03/03/2016, DJe 15/03/2016).

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Rodrigo Leite

Autor e coautor de 4 livros jurídicos (Saraiva e Juspodivm)

Mestre em Direito Constitucional

Assessor de Desembargador do TJRN

Professor da Pós On-line de Civil da Rede Kroton-LFG

Conteudista dos sites justicapotiguar.com.br (RN), novodireitocivil.com.br (BA), meusitejuridico.com.br (SP) e supremotv.com.br (MG).


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