| 17 fevereiro, 2020 - 07:55

Juiz de SP exige que presos tenham acesso à água quente e chama banho frio de tortura

 

Na sentença, o magistrado acolhe o argumento de que o banho frio é um tipo de tortura

O juiz Adriano Marcos Laroca, da 12ª Vara da Fazenda Pública, obriga o governo de São Paulo a fornecer água quente para que presos deixem de tomar banho frio em todas as unidades prisionais do estado (leia aqui sentença completa).

Ilustrativa

Na sentença, o magistrado acolhe o argumento de que o banho frio é um tipo de tortura, cita Racionais e lança mão de bibliografia sobre a facção paulista PCC (Primeiro Comando da Capital) para criticar a política prisional e destaca as consequências do encarceramento em massa.

“Manter o preso em condições indignas, ainda que seja uma decisão político-administrativa, apoiada por muitos na sociedade civil, é absolutamente ilegítima, inconstitucional, violadora do mínimo existencial da dignidade humana”, escreve, na conclusão da decisão, e frisa que aceitar tal fato como natural é o “reconhecimento de que vivemos em estado de exceção”.

De acordo com a Defensoria Pública de São Paulo, autora da ação civil pública, dos 186 presídios em SP, apenas 27 têm instalações para aquecimento de água. Há prisões onde há chuveiro elétrico na cela ou na enfermaria, mas apenas o preso “faxina” (ou piloto, vinculado ao PCC) pode usar.

Com relação às carceragens, de responsabilidade de Secretaria de Segurança Pública, apenas 11 dispõem de instalações adequadas para banho morno das 30 existentes.

Na decisão, Laroca destaca trecho da ação da Defensoria que informa que o banho frio pode causar ou piorar quadros de doenças. “Configura ato de tortura sobretudo nos dias mais frios, tudo agravado pela ausência de atendimento médico nos presídios, conforme relatório do CNJ. Menciona, ainda, como agravante a superlotação dos estabelecimentos, além da ausência ou insuficiência no fornecimento de cobertores e agasalhos”, cita o juiz.

E outro trecho da sentença, para explicar a falência do sistema prisional, Laroca faz um verdadeiro arrazoado da história do rap como expressão genuína dessa realidade, citando até Afrika Bambaataa. “Se a música clássica de Bach, escrita de tradição camerística e sinfônica, servia à missa, o Rap (segunda geração Emicida AmarElo: ‘permita que eu fale, não as minhas cicatrizes’; Criolo com Boca de Lobo: ‘é que a indústria da desgraça pro governo é um bom negócio’; Rashid – Estereótipo: ‘quando a definição de suspeito vem com uma tabela de cores’), escrita poética de dicção temática via de regra, pode servir ao Papa Francisco, à sua ‘ecologia integral’, crítica da degradação social e ambiental, da violência, da exploração humana, do consumismo exacerbado, da injustiça com os excluídos”, escreve.

Ao criticar a política criminal e definir o fracasso do cárcere, Laroca mescla citação do livro “Irmãos”, de Gabriel Feltran, com o álbum que virou livro “Sobrevivendo no inferno”, dos Racionais. “As políticas criminais, de crescente encarceramento, logo após a redemocratização, serviram de alimento ao poder da facção, primeiro, dentro, depois fora das prisões”, argumenta.

E segue. “Quase certo que a taxa de homicídio no Estado de São Paulo em queda desde 2001 tenha como concausa, ou se correlaciona com a ‘bandeira branca das quebradas’ imposta pela facção, concretização legitimada por parcela da sociedade, mas equivocada, da ‘fórmula mágica da paz’ (a malandragem de verdade é viver) dos Racionais MC’s, cantada em meados da década de 1990, ‘época das guerras’”.

O juiz Adriano Marcos Laroca também critica o punitivismo, a “histórica desigualdade social intocada pelo poder”, a guerra às drogas e destaca o perfil do apenado: jovem, negro e pobre. “A política repressiva que dura trinta anos não reduziu o tráfico nem o consumo, só elevando o encarceramento (em torno de 70% dos presos relacionados com os crimes de tráfico de drogas e roubo), e que estes alimentam financeiramente as facções criminosas, o poder político junto com a sociedade civil deveria ao menos debater a possibilidade da descriminalização das drogas, como já ocorreu em outros países”, afirma, defendendo o livre mercado e adoção de políticas de redução de danos.

Na sentença, o magistrado acolhe o argumento de que o banho frio é um tipo de tortura, cita Racionais e lança mão de bibliografia sobre a facção paulista PCC (Primeiro Comando da Capital) para criticar a política prisional e destaca as consequências do encarceramento em massa.

“Manter o preso em condições indignas, ainda que seja uma decisão político-administrativa, apoiada por muitos na sociedade civil, é absolutamente ilegítima, inconstitucional, violadora do mínimo existencial da dignidade humana”, escreve, na conclusão da decisão, e frisa que aceitar tal fato como natural é o “reconhecimento de que vivemos em estado de exceção”.

De acordo com a Defensoria Pública de São Paulo, autora da ação civil pública, dos 186 presídios em SP, apenas 27 têm instalações para aquecimento de água. Há prisões onde há chuveiro elétrico na cela ou na enfermaria, mas apenas o preso “faxina” (ou piloto, vinculado ao PCC) pode usar.

Com relação às carceragens, de responsabilidade de Secretaria de Segurança Pública, apenas 11 dispõem de instalações adequadas para banho morno das 30 existentes.

Na decisão, Laroca destaca trecho da ação da Defensoria que informa que o banho frio pode causar ou piorar quadros de doenças. “Configura ato de tortura sobretudo nos dias mais frios, tudo agravado pela ausência de atendimento médico nos presídios, conforme relatório do CNJ. Menciona, ainda, como agravante a superlotação dos estabelecimentos, além da ausência ou insuficiência no fornecimento de cobertores e agasalhos”, cita o juiz.

E outro trecho da sentença, para explicar a falência do sistema prisional, Laroca faz um verdadeiro arrazoado da história do rap como expressão genuína dessa realidade, citando até Afrika Bambaataa. “Se a música clássica de Bach, escrita de tradição camerística e sinfônica, servia à missa, o Rap (segunda geração Emicida AmarElo: ‘permita que eu fale, não as minhas cicatrizes’; Criolo com Boca de Lobo: ‘é que a indústria da desgraça pro governo é um bom negócio’; Rashid – Estereótipo: ‘quando a definição de suspeito vem com uma tabela de cores’), escrita poética de dicção temática via de regra, pode servir ao Papa Francisco, à sua ‘ecologia integral’, crítica da degradação social e ambiental, da violência, da exploração humana, do consumismo exacerbado, da injustiça com os excluídos”, escreve.

Ao criticar a política criminal e definir o fracasso do cárcere, Laroca mescla citação do livro “Irmãos”, de Gabriel Feltran, com o álbum que virou livro “Sobrevivendo no inferno”, dos Racionais. “As políticas criminais, de crescente encarceramento, logo após a redemocratização, serviram de alimento ao poder da facção, primeiro, dentro, depois fora das prisões”, argumenta.

E segue. “Quase certo que a taxa de homicídio no Estado de São Paulo em queda desde 2001 tenha como concausa, ou se correlaciona com a ‘bandeira branca das quebradas’ imposta pela facção, concretização legitimada por parcela da sociedade, mas equivocada, da ‘fórmula mágica da paz’ (a malandragem de verdade é viver) dos Racionais MC’s, cantada em meados da década de 1990, ‘época das guerras’”.

O juiz Adriano Marcos Laroca também critica o punitivismo, a “histórica desigualdade social intocada pelo poder”, a guerra às drogas e destaca o perfil do apenado: jovem, negro e pobre. “A política repressiva que dura trinta anos não reduziu o tráfico nem o consumo, só elevando o encarceramento (em torno de 70% dos presos relacionados com os crimes de tráfico de drogas e roubo), e que estes alimentam financeiramente as facções criminosas, o poder político junto com a sociedade civil deveria ao menos debater a possibilidade da descriminalização das drogas, como já ocorreu em outros países”, afirma, defendendo o livre mercado e adoção de políticas de redução de danos.

Ponte


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1 Comentários
  1. Carla

    03/07/2020 às 01:19

    A raça humana está desprezando a vida. Banho quente não deveria ser discutido, é direito do ser humano. Que polêmica a respeito de um assunto tão fundamental, assunto onde o banho quente é dever de ser disponível a todos os seres, presos ou não. Eles são vidas, ainda estão vivos, merecem tratamento de vivo. A favor do banho quente sim. Pra eles e pra mim. Absurdo negar esta dignidade.

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