Morreu neste sábado (8/4) o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, do Superior Tribunal de Justiça. Ele tinha 63 anos e ocupava vaga na corte desde 2010. Estava internado no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, devido a um câncer. Era casado e tinha dois filhos.
O velório será neste domingo (9/4), a partir das 10h, na capela do Cemitério São José, no Crematório Metropolitano de Porto Alegre . Na segunda-feira, o velório prosseguirá a partir das 7h30, no auditório do Crematório Metropolitano. A cerimônia de despedida está prevista para as 15h.
Integrante da 3ª Turma, da 2ª Seção e da Corte Especial, ele presidiu a Comissão Gestora de Precedentes e foi responsável por incentivar e viabilizar o surgimento de um sistema jurisprudencial mais robusto e adequado a partir dos precedentes formados pelo tribunal.
Os períodos de afastamento para tratamento médico se intensificaram no ano passado. Na primeira sessão da 3ª Turma em 2023, emocionou os colegas ao retornar de licença e foi muito exaltado. “Agradeço todo o carinho e solidariedade ao longo do meu afastamento. Retorno com muita alegria aos trabalhos. Vamos ter um excelente ano, é o que eu desejo a todos”, disse, na ocasião.
Sanseverino participou ativamente do período eleitoral de 2022 como ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral, cargo que o levou a exercer a intensa função de juiz da propaganda eleitoral nas eleições mais tensas que o país viveu desde a redemocratização.
Bacharel em Direito pela PUC-RS (1983), Paulo de Tarso Sanseverino foi servidor do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Tribunal Regional Eleitoral gaúcho antes de se tornar promotor de Justiça e, em 1986, ser aprovado em concurso para juiz de Direito. Desembargador do TJ-RS a partir 1999, chegou ao STJ nomeado por Luiz Inácio Lula da Silva em agosto de 2010. O ministro era mestre (2000) e doutor (2007) em Direito pela UFRGS.
Perfil
Para além dos processos aos quais se dedicava, estava entre os ministros interessados em estudar o Poder Judiciário e buscar soluções para melhorar a prestação jurisdicional. Era entusiasta de longa data do uso da tecnologia na atividade das cortes brasileiras.
Em 2019, afirmou em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico que o Judiciário deveria se preparar para o impacto da inteligência artificial. À época, investia tempo na leitura de obras sobre o impacto imediato das novas tecnologias na sociedade contemporânea.
Já em 2021, relatou ao Anuário da Justiça Brasil o interesse no impacto da epidemia de Covid-19 nas novas tecnologias. “Aquilo que ia acontecer talvez em dez anos acabou acontecendo em seis meses”, afirmou ele.
O ministro entendia que o protagonismo recente do Poder Judiciário e sua maior exposição impuseram aos magistrados um maior controle social, o que gerou a necessidade de investir em diálogo e compreender essa nova realidade. Tanto quanto pôde, participou de eventos, palestras e seminários.
Comissão gestora de precedentes
O magistrado fez um trabalho de grandioso impacto à frente da Comissão Gestora de Precedentes, a partir de 2017. Primeiro internamente, ajudando os gabinetes a agilizar os julgamentos. Depois, dirigiu-se aos tribunais de segundo grau, que se tornaram grandes parceiros do STJ na formação de precedentes qualificados.
Com ajuda deles, implementou um amplo monitoramento de demandas repetitivas ainda nas instâncias ordinárias e a eficiente comunicação dos precedentes qualificados. Por fim, abriu um necessário canal de diálogo para conscientizar sobre a importância de observar esses precedentes e uniformizar a jurisprudência nacional.
Sanseverino dizia que identificar demandas repetitivas equivalia a praticar guerra de guerrilha. “A questão é atuar rapidamente para evitar que o problema fique crônico.” As boas práticas instituídas no STJ foram depois replicadas no Supremo Tribunal Federal, no Conselho Nacional de Justiça e em outros tribunais do país.
Apesar disso, não via saída para o excesso de processos recebidos pelo STJ que não fosse a criação do filtro da relevância, confirmado na Emenda Constitucional 125/2022. Gostava do fato de ela se espelhar na sistemática da repercussão geral do STF e previa que, com sua entrada em vigor, os julgamentos de recursos repetitivos seriam absorvidos.
Julgados
Em quase 13 anos de STJ, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino participou de muitos julgados de destaque. Entre eles, relatou aquele em que a 3ª Turma aderiu à posição de que é possível alterar nome e sexo que constam no registro civil de transexual que não passou por cirurgia de redesignação sexual, que definiu como significativo avanço jurisprudencial.
Decidiu que proteção aos direitos autorais permanece mesmo que a obra esteja localizada ou seja realizada em locais públicos, como o desfile das escolas de samba. O caso serviu para condenar um portal que não tinha os direitos de transmissão para o Carnaval de São Paulo, mas exibiu imagens e sons das áreas do entorno da Sapucaí.
Em 2020, ajudou a 3ª Turma a rever o acórdão que tinha reconhecido como ilegal a cobrança da taxa de conveniência para ingressos comprados pela internet em sites de eventos. A posição foi reformada em embargos de declaração e evitou a indevida fixação de um posição de impacto grave para o setor de entretenimento.
Fixou que o direito de pleitear a restituição de descontos indevidos feitos por plano de previdência complementar prescreve em dez anos, acórdão que mudou a jurisprudência da 3ª Turma a partir de um precedente da Corte Especial sobre cobrança de indébito.
Relatou o recurso em que uma companhia aérea e uma agência de turismo foram condenadas a indenizar um casal de consumidores que não foram informados corretamente que, para embarcar da Bolívia para o Brasil, o passageiro estrangeiro precisava comprar também o bilhete de retorno — considerou falha na prestação do serviço.