| 2 abril, 2023 - 15:20

Como decisões de Lewandowski derrubam peça por peça a delação da Odebrecht

 

No início de 2016, o ex-presidente José Sarney não teve dúvidas quando questionado por um aliado sobre as delações premiadas que estavam prestes a serem detonadas pela Lava-Jato. “Odebrecht vem com uma metralhadora de ponto 100”, resumiu ele, sem saber que estava sendo gravado pelo interlocutor. Àquela altura, a maior empreiteira do país negociava a

No início de 2016, o ex-presidente José Sarney não teve dúvidas quando questionado por um aliado sobre as delações premiadas que estavam prestes a serem detonadas pela Lava-Jato. “Odebrecht vem com uma metralhadora de ponto 100”, resumiu ele, sem saber que estava sendo gravado pelo interlocutor. Àquela altura, a maior empreiteira do país negociava a “delação do fim do mundo”. O inventário da corrupção da Odebrecht envolveu 78 executivos, incluindo Emílio e Marcelo Odebrecht, da família controladora.

Na política, acabaram sendo enredados na teia o presidente à época, Michel Temer, e quase todos os outros do período da redemocratização, além de governadores, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e até vereadores. Descobriu-se que as propinas pagas eram contabilizadas em um departamento secreto da companhia e os beneficiários recebiam apelidos (Lula era o “Amigo”, por exemplo). Passados seis anos, numa surpreendente reviravolta, as principais peças originadas das múltiplas investigações começaram a cair, uma a uma, na Justiça, pela caneta de Ricardo Lewandowski, do STF. Nos últimos dezoito meses, o ministro, que está prestes a se aposentar do Supremo, suspendeu nada menos que dezoito processos e determinou o trancamento de outros cinco.

Reprodução

A peça que precipitou o efeito cascata foi uma decisão que beneficiou o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva. Em agosto de 2020, Cristiano Zanin, advogado do petista e, por coincidência, favorito hoje a ocupar a vaga de Lewandowski no Supremo, acionou o STF insistindo no acesso ao acordo de leniência da Odebrecht, que baseava o processo da Lava-Jato contra Lula no caso da compra, pela empreiteira, de um imóvel para abrigar o Instituto Lula. Após esse pedido, Lewandowski deu ao advogado acesso às mensagens da chamada Vaza-Jato. Diante de chats que indicavam cooperação ilegal entre a força-tarefa de Curitiba e autoridades estrangeiras nas tratativas do acordo da Odebrecht e o manuseio irregular de material, que chegou a ser carregado em sacolas de supermercado pelos procuradores, Lewandowski determinou que as provas do acordo de leniência não poderiam ser usadas contra Lula no processo da sede do instituto. Tomada em junho de 2021, a decisão afetou, sobretudo, os sistemas Drousys e MyWebDay B. Eles geriam o “departamento de operações estruturadas” da Odebrecht, responsável pelos pagamentos de propina. Em fevereiro de 2022, a Segunda Turma do Supremo confirmou a decisão. “Foi um golpe grande na delação como um todo”, diz um ex-advogado da companhia.

A partir da anulação das provas contra Lula, que depois levou ao encerramento de três processos contra ele, começaram a aportar pedidos a Lewandowski para estender a decisão, de modo a suspender ou enterrar outras ações penais envolvendo material da Odebrecht. Diante disso, a Procuradoria-Geral da República tentou reverter o caso, sem sucesso. O órgão alegou que o Supremo estava ampliando ilegalmente o mote do pedido inicial da defesa de Lula, ou seja, acesso ao acordo de leniência da Odebrecht, e passava por cima de instâncias inferiores. A PGR não chegou a defender a validade das provas e rebateu timidamente a afirmação de Lewandowski de que houve tratativas irregulares com autoridades internacionais. “Outros países, como Peru, Equador, Panamá, reputam essas provas plenamente válidas e confiáveis e as usaram contra a corrupção e o suborno de altos funcionários públicos. Com todo respeito ao ministro, o Brasil está desperdiçando a oportunidade de fazer o mesmo”, diz o ex-juiz e senador Sergio Moro (União-PR), que homologou a leniência da Odebrecht com a Lava-Jato.

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