Angélica Fonseca, especial para o Justiça Potiguar
Por trás de cada vítima de violência letal e intencional, seja homicídio, feminicídio ou latrocínio, está uma família enlutada e marcada pela dor da ausência e pela brutalidade dos crimes. Uma lembrança difícil de apagar e que, em muitos casos, não tem ainda uma resposta da justiça. Dentro desse contexto, o Ministério Público do RN criou no último mês de julho um projeto piloto, o Núcleo de Apoio às Vítimas de Violência Letal e Intencional (NUAVV), por meio do qual, nos primeiros três meses, mais de 34 famílias, que perderam entes queridos, receberam assistência jurídica, social e psicológica para o enfrentamento do luto e a busca pela justiça.
“A resposta da justiça é um fator determinante para a recuperação dessa família que, na maioria dos casos, é de pessoas de classes sociais mais baixas, que muitas vezes não sabem como procurar órgãos de justiça, ter acompanhamento social e de saúde. É, então, nessa fase que chegamos”, explicou o promotor de Justiça e coordenador do NUAVV, Vinícius Leão.
O público alvo chega ao NUAVV por demanda espontânea, indo pessoalmente a sede do Ministério Público, ou por meio de uma busca ativa da equipe técnica junto aos órgãos de imprensa. “Normalmente, quando a família vai buscar veículos de comunicação, a investigação está paralisada. Desse modo, entra nosso produto principal que é buscar assegurar a essas famílias o direito à informação e também trazer dados para as autoridades, a fim da resolução do caso”, enfatizou o promotor.
O Núcleo é um desdobramento de um projeto institucional do MPRN, chamado Depois do Vazio, e começou a ser pensado em julho de 2021. Com o apoio da Procuradoria Geral de Justiça e com inspirações em projetos do Ministério Público do Ceará e Tocantins, o projeto começou a ser formatado até o ano seguinte, ocasião em que o Conselho Nacional do MP também lançou resolução para que os órgãos estaduais tivessem setores para atender familiares vítimas de violência.
“Quando recebemos uma demanda e entramos na busca por informações temos visto que as investigações em sua maioria estão paralisadas, por toda uma questão de déficit estrutural dos órgãos devido a alta demanda, vemos um caso por exemplo que nos chegou de 2017 e que não houve avanços para uma resolução e uma resposta aos familiares”, explicou o promotor.
Ao chegar ao NUAVV, o público recebe acolhimento qualificado da equipe do projeto, dispondo de assessoria jurídica e assistência social, como também encaminhamento para atendimento psicológico. “Normalmente essas famílias, que são vítimas indiretas da violência, enfrentam processos de depressão, ideação suicida e estão totalmente desamparadas das ações do Estado, precisando de alguma instrução para recomeçar a vida”, descreveu Vinícius Leão.
O NUAVV está na sua primeira fase de implantação enquanto projeto piloto e atendendo casos ocorridos em Natal, tendo inclusive firmado convênios com as secretarias municipais de Saúde e Assistência Social para formação de uma rede de apoio.
“Muito importante essa parceria. Ter a Semtas colaborando no acolhimento dessas famílias vulneráveis e realizando o encaminhando delas para nossos Centros de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), a fim de que possam ter todo o apoio técnico, psicológico e social é de suma importância”, afirmou a secretária da Semtas, Ana Valda Galvão.
As próximas metas do NUAVV estão na expansão de atendimentos para região metropolitana e cidades polos do interior do estado, como Mossoró e Caicó, e de novas cooperações técnicas com instituições. “Ao final do primeiro semestre iremos avaliar nossos indicadores para podermos dar passos de expansão para outras regiões, além de dialogar com outras instituições, como a OAB, UFRN e Governo do Estado, visando a expansão da nossa rede de apoio”, informou Vinícius Leão.
2 anos sem José Carlos e sem justiça
Era manhã do dia 21 de outubro de 2020 e o pequeno José Carlos da Silva de 8 anos ia para o seu destino comum de quase todos os dias, estar com os irmãos no semáforo das avenidas João Medeiros Filho e Moema Tinôco, no bairro da Redinha, zona Norte de Natal, porém dessa vez ele não chegaria ao destino.
Os dias foram se passando e a angústia da família aumentava com o paradeiro da criança, tendo procurado várias vezes a polícia, imprensa e fechado o trânsito na ponte Newton Navarro para clamar por notícias do menino que só veio de forma trágica 22 dias depois, no dia 12 de novembro de 2020 com o encontro do corpo enterrado em um terreno baldio na região do Rio Doce, cerca de 400 metros de onde ele morava. A dor ainda seguiu por muitos dias até a confirmação da identidade de José Carlos por meio de exame de DNA realizado pelo Instituto Técnico-Científico de Perícia (ITEP-RN).
“Nunca mais fomos procurados e acabou que ficamos sem resposta, tendo que reunir forças para seguir”, disse Ozenilde das Dores da Silva, mãe que carrega a dor no nome pela morte do filho e afirmou não ter recebido qualquer apoio psicológico ou jurídico. Em entrevista por telefone ao Justiça Potiguar se mostrou reticente em abordar o caso novamente e não seguiu a conversa instigada ainda em outros dias.
Sobre o caso, a Polícia Civil informou que em junho de 2021 o inquérito policial foi concluído e remetido à Justiça, que o arquivou sem apontar o autor do crime.
SERVIÇO
Núcleo de Apoio às Vítimas de Violência Letal e Intencional (NUAVV)
Endereço: Rua Promotor Manoel Alves Pessoa Neto, 97, Candelária.
Horário: 8h às 15h, de segunda a quinta-feira, e das 8h às 14h, nas sextas-feiras.
Contatos e-mail: nuavv@mprn.mp.br e pelo telefone/whatsapp (84) 99972-5351.