| 24 maio, 2021 - 17:06

Fux julga no Supremo processos de clientes do filho advogado em outra instância

 

Dono de um escritório de advocacia que leva o sobrenome do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, o filho do ministro, Rodrigo Fux, atua perante os tribunais de Brasília na defesa de grandes empresas como Golden Cross, Embraer, H. Stern e concessionárias de serviços públicos, como a Light. Nos processos em curso no Supremo

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Dono de um escritório de advocacia que leva o sobrenome do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux, o filho do ministro, Rodrigo Fux, atua perante os tribunais de Brasília na defesa de grandes empresas como Golden Cross, Embraer, H. Stern e concessionárias de serviços públicos, como a Light.
 
Nos processos em curso no Supremo em que o filho figura como advogado, o ministro se declara suspeito e não participa dos julgamentos. Mas Fux julga ações que envolvem empresas com as quais Rodrigo tem ou teve relações profissionais em outras instâncias.
 
É o caso, por exemplo, de litígios da Estácio de Sá, da Embraer, da Companhia de Gás do Rio de Janeiro e da Light, prestadora de serviços de iluminação no Rio.
 
Rodrigo já advogou para essas quatro empresas no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e, no Supremo, Fux participa de julgamentos em que elas estão envolvidas.
 
O ministro diz que não há relação entre a atuação do filho e a sua como magistrado.
 
“A suspeição é objetiva em relação aos casos que envolvem o filho ou o escritório do filho e não se estendem a empresas que, porventura, tenham contratado o escritório para outros processos. Sabe-se que as empresas têm a prática de contratar diversos escritórios para causas distintas”, diz o presidente do STF.
 
Ele argumenta que não atuou em nenhum dos 28 processos em que o filho figura como defensor de uma das partes no tribunal que preside.
 
É recorrente a atuação de parentes de ministros como advogados em tribunais superiores de Brasília. Nada proíbe que filhos de ministros advoguem em causas que tramitam no mesmo tribunal. Nesses casos, os magistrados ficam impedidos de julgá-las.
 
Nos bastidores, ministros relatam constrangimento em decidir sobre ações nais quais filhos de colegas figuram como advogados.
 
Não há irregularidade, embora haja debate antigo no mundo jurídico sobre a atuação de parentes próximos de magistrados.
 
No STF, os casos mais conhecidos são de Guiomar Mendes e Roberta Rangel, esposas, respectivamente, de Gilmar Mendes e Dias Toffoli. A primeira é sócia do escritório Sérgio Bermudes Advogados, e a segunda, da Warde Advogados, duas das maiores bancas do país.
 
Já no STJ, o presidente da corte, Humberto Martins, e os ministros João Otávio de Noronha e Francisco Falcão têm filhos que atuam no tribunal.
 
Em 2016, quando Falcão presidia o STJ, o jornal Folha de São Paulo mostrou que o magistrado tomou decisões em processos representados pelo filho, Djaci Falcão Neto. No ano passado, reportagem também apontou o aumento da atuação dos herdeiros de Noronha, ex-presidente do tribunal, na advocacia criminal depois de o pai assumir o comando da corte.
 
O Código de Processo Penal prevê que o magistrado deve se declarar suspeito apenas quando o cônjuge ou parente de até terceiro grau “sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes”. O mesmo deve ocorrer em casos em que o juiz for “amigo íntimo ou inimigo capital” de uma das partes.
 
O escritório do filho de Fux fica no Rio de Janeiro, leva o nome da família e conta com ao menos 25 advogados.
 
Os processos no STF envolvem os mesmos clientes do filho de Fux, mas não necessariamente têm vínculo com ações em que ele defende a empresa em outra instância.
 
No STJ, segundo tribunal mais importante do país, Rodrigo figura em 202 processos. No STF, são 28 causas patrocinadas pelo filho do presidente -nesses casos, quando aparece o nome do escritório, outra banca assume a causa. Em todos, Fux se declara impedido.
 
O magistrado segue julgando, porém, ações de empresas com que o filho tem ou já teve relação profissional, mas em que ele não aparece como responsável pelo processo. Como Rodrigo defende grandes multinacionais, as empresas têm inúmeras ações no Supremo com diversos advogados em diferentes causas.
 
Fux já deu decisões contrárias às contratantes do filho. Em outros casos, impôs derrotas a quem acionava a corte contra essas empresas.
 
Rodrigo representa a Estácio de Sá em processos que tramitaram até este ano no STJ. No Supremo, em abril de 2021, Fux impediu que tramitasse na corte um processo contra a instituição de ensino. Ele afirmou que o processo movido por uma mulher para contestar decisão da instituição relativa ao financiamento estudantil foi protocolado no STF fora do prazo e, por isso, devolveu o recurso à primeira instância.
 
Rodrigo também atuou como advogado da Embraer no STJ em 2012. Em 2014, um homem recorreu ao Supremo após ser condenado porque teria vazado documentos da fabricante aérea. Ele pediu ao STF a subida do processo para que fosse analisado pela corte, mas Fux rejeitou o pedido.
 
Em relação à H. Stern, Fux devolveu à primeira instância, em 2014, processo em que Pernambuco requeria a cobrança de imposto da loja para vendas no exterior. Em 2020, o STF estabeleceu, com voto de Fux, tese sobre o tema que definia a não isenção do imposto, como havia defendido o estado seis anos antes.
 
A Companhia Distribuidora de Gás do RJ é defendida por Rodrigo em processos que tramitaram no STJ até este ano. Também em 2021, Fux rejeitou recurso da empresa, alegando que o caso exigiria reexame de provas.
 
Outra empresa que já teve Rodrigo como advogado é a Golden Cross, da área privada de saúde. Um processo tramitou no STJ em 2011 e teve o filho de Fux como representante. Em 2015, Fux rejeitou recurso de um homem que questionava a mensalidade do plano de saúde e devolveu o caso para as instâncias inferiores do Judiciário.
 
Em relação à Light, o filho de Fux representou a empresa em um processo que tramitou no STJ de 2009 a 2011. Em 2020, o ministro julgou dois processos que envolviam a companhia.
 
O professor da FGV Direito de São Paulo Rubens Glezer afirma que o Judiciário deveria repensar o sistema de declaração de suspeição e impedimento dos magistrados e que há pouca transparência atualmente no STF em relação aos casos em que os ministros afirmam não poder julgar determinado processo.

Folhapress


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