| 19 março, 2021 - 15:03

Juiz dá bronca ao não reconhecer vínculo de emprego: “fanfarrão”

 

Em decisão dura e cheia de sarcasmo, o juiz do Trabalho Leonardo Aliaga Betti, de Mogi das Cruzes/SP, chamou um trabalhador de “fanfarrão” ao negar pedido de reconhecimento de vínculo de emprego. O magistrado considerou que o rapaz atuava como sócio, e não como subordinado. (Imagem: Arte Migalhas) À Justiça, o reclamante afirmou que manteve

Em decisão dura e cheia de sarcasmo, o juiz do Trabalho Leonardo Aliaga Betti, de Mogi das Cruzes/SP, chamou um trabalhador de “fanfarrão” ao negar pedido de reconhecimento de vínculo de emprego. O magistrado considerou que o rapaz atuava como sócio, e não como subordinado.

(Imagem: Arte Migalhas)

(Imagem: Arte Migalhas)

À Justiça, o reclamante afirmou que manteve relação de emprego no período de 23/5/19 a 3/2/20, no cargo de gerente. Alegou, ainda, que, a despeito do vínculo empregatício entre as partes, a reclamada jamais efetuou o registro do contrato ou pagou as verbas dele decorrentes.

A suposta empregadora apresentou defesa, acompanhada de documentos, na qual argumenta que é parte ilegítima e que jamais manteve com o reclamante vínculo de natureza empregatícia, postulando, em função disso, a improcedência de todos os pedidos.

Ela diz, também, que encerrou suas atividades justamente na data em que o autor alega haver sido contratado como seu empregado. Narra que, no local respectivo, iniciou-se atividade empresarial distinta, afastando-se a acionada do negócio.

Na avaliação do caso, o juiz considerou que não houve relação jurídica entre as partes.

“De acordo com o Dicionário Michaelis (disponível em https://michaelis.uol.com.br), constitui fanfarrice ‘ato, dito ou modos de fanfarrão; parada, presepada, rodamontada; ostentação de bravura e valentia, geralmente exagerada e mentirosa; bazófia, bravada, jactância’. O presente feito é uma verdadeira fanfarrice. O reclamante, um fanfarrão.”

Como o magistrado chegou a essa conclusão? Pegue uma pipoca e acompanhe.

Esmigalhando o caso

Junto com a defesa, a suposta empregadora juntou boletim de ocorrência lavrado a pedido de um homem chamado “Nino” (não o saudoso Nino do Castelo Rá-TimBum), em que este afirma que, meses antes, decidiu pactuar contrato de sociedade com a reclamada, a fim de inaugurar um novo negócio no local em que por décadas instalou-se a empresa envolvida na controversa.

No mesmo boletim, Nino afirmou expressamente que assumiu a reforma completa do local, sob o pacto de que se tornaria proprietário de 50% do estabelecimento, que veio a ser inaugurado em 30/11/19, quando mudou de nome e de atividade. Nino ali deixa claro que arcou com todas as despesas a partir de então dedicadas ao negócio, tanto no que se refere à reforma do local como no que tange à atividade exercida (despesas de uso e de estoque).

O autor da ação, entretanto, não incluiu Nino no polo passivo da demanda. Por quê?

“Afinal, se Nino assumira o negócio e confessara dele ser proprietário, dúvidas não existiriam de que, à luz da legislação trabalhista, teria (…) total interesse que o patrimônio do novo sócio se somasse ao da reclamada para fins de futura execução.”

Na análise do juiz, a negativa (ou melhor, a expressa recusa) do autor da ação foi sintomática.

“O fanfarrão não quer justiça. Quer proteger o amigo Nino, pois sabe que, de fato, foi especificamente com ele que manteve vínculo (societário, vale frisar), liame que jamais contou com qualquer participação, mínima que seja, da reclamada.”

Segundo o magistrado, já no início de seu depoimento, o fanfarrão afirmou que “‘o Sr. Nino não manteve qualquer interesse em abrir um negócio no local em que estava estabelecida a trattoria’. Óbvio que aí se encontra a primeira e grande mentira do processo, pois, como mencionado, o próprio Nino se declarara como tal no boletim de ocorrência.”

Além disso, testemunhas afirmaram que o negócio passou a ser tocado por Nino e pelo fanfarrão.

“Aí está, portanto, o fato determinante que leva à improcedência total desta demanda: o fanfarrão jamais foi empregado do reclamado (ou mesmo de Nino); ingressou como sócio na empreitada; sócio de Nino, que foi quem assumiu formalmente e de fato a propriedade do negócio.”

Para o juiz, o fanfarrão agia como verdadeiro dono do negócio (não mero gerente), tanto que não precisava pedir autorização para adquirir material ou mesmo para as diretrizes sobre o andamento da obra.

“Ora: e por que a reclamada (e seu marido) acompanhavam de perto o negócio? Pelo simples fato de que, formalmente, ainda eram proprietários do estabelecimento, tanto que a pessoa jurídica ainda permanecia ativa.”

Conforme entendeu o julgador, a reclamada limitou-se a participar da inauguração, não mais aparecendo no local, que ficara sob a batuta do próprio fanfarrão.

“Enfim: está bastante claro que: 1) (…), o fanfarrão, não foi contratado, subordinado ou assalariado pela reclamada; 2) o fanfarrão manteve vínculo societário exclusivamente com Nino, a quem defende exaustivamente, não por acaso; e 3) se, formalmente, a reclamada continua à frente do estabelecimento, de fato não participa do empreendimento há muito, precisamente desde maio de 2019, justamente por ocasião do fanfarrão.”

Assim, julgou os pedidos improcedentes e condenou o fanfarrão ao pagamento de multa de R$ 10 mil, por má-fé.

O advogado Hério Nagoshi atua na causa.

Leia a decisão.

Migalhas


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