| 16 novembro, 2020 - 16:28

“Indignação, desrespeito e violação de direitos”, diz advogado que fez audiência do hospital

 

“Indignação, desrespeito e violação de direitos”. É assim que o advogado criminalista Flávio Grossi resume a situação que enfrentou na última quarta-feira (11/11) após ter tido que participar, da cama do hospital, de uma audiência na 4ª Auditoria da Justiça Militar do Estado de São Paulo. Grossi, que é assistente de acusação em um processo conduzido pelo

Flávio Grossi, advogado que participou de audiência do hospital
Flávio Grossi, advogado que participou de audiência do hospital / Foto: Reprodução

“Indignação, desrespeito e violação de direitos”. É assim que o advogado criminalista Flávio Grossi resume a situação que enfrentou na última quarta-feira (11/11) após ter tido que participar, da cama do hospital, de uma audiência na 4ª Auditoria da Justiça Militar do Estado de São Paulo.

Grossi, que é assistente de acusação em um processo conduzido pelo juiz José Álvaro Machado Marques, foi internado no último domingo (8/11) com quadro de insuficiência respiratória, provavelmente causado pela Covid-19, sem previsão de alta. No dia seguinte, ele solicitou à equipe do magistrado que a audiência fosse remarcada devido ao seu quadro de saúde.

O pedido, que foi enviado juntamente com um atestado médico, foi negado. Segundo justificativa enviada por e-mail ao advogado, o juiz não autorizou redesignação da audiência tendo em vista que as intimações “demandam diversos esforços” e também por causa das “metas estabelecidas pelo CNJ para julgamento dos feitos”. Sem alternativas, o advogado participou da audiência do hospital, usando cateter de oxigênio e camisola.

Em entrevista ao JOTA, Grossi avaliou que a atitude do juiz violou o artigo 1.004 do Código de Processo Civil, de 2015, que dispõe que “se, durante o prazo para a interposição do recurso, sobrevier o falecimento da parte ou de seu advogado ou ocorrer motivo de força maior que suspenda o curso do processo, será tal prazo restituído em proveito da parte, do herdeiro ou do sucessor, contra quem começará a correr novamente depois da intimação”.

“Olha, eu já vi desmarcarem audiência porque o advogado tinha viagem marcada previamente, porque mãe de desembargador morreu, porque alguém bateu o carro. É lei: art. 1004, CPC. O juiz não tinha escolha. Indignação, desrespeito e violação de direitos. Acho que são os principais adjetivos [sobre como me senti]”, disse o criminalista.

Ele afirmou que ficou “embasbacado” com a postura do magistrado. “Fugiu absolutamente do comum e, pior, divorciou-se da lei e das normativas acerca de audiências virtuais emitidas pelo Conselho Nacional de Justiça. Parece que o juiz não conhecia o texto da lei. Eu fiquei embasbacado. Não sei o que é pior: a manutenção da audiência ou os argumentos usados pelo juiz para mantê-la”, disse.

O artigo 3º, §2º, da Resolução 314/2020 do CNJ, estabelece que os atos processuais que não puderem ser praticados pelo meio eletrônico, por absoluta impossibilidade prática apontada e devidamente justificada pelo interessado, deverão ser adiados por decisão fundamentada do magistrado. Já o § 3º do mesmo dispositivo legal estipula que os prazos processuais serão suspensos se a parte informar ao juízo competente a impossibilidade da prática do ato.

No entendimento de Grossi, houve falta de empatia por parte do juiz sobre a sua condição de saúde. Além disso, acredita que pode ter havido um “sentimento pessoal do magistrado” em relação ao caso em específico e à sua atuação, que vem sendo, segundo ele, muito enérgica.

“Eu trabalho desde o primeiro dia de instauração de inquérito policial. Participei de coleta de todos os elementos de informação da investigação, fiz audiência de acareação, requeri o indiciamento e denúncia, prosseguimento de investigação relacionada a outras vitimas e venho fazendo parte da instrução desde sempre. Mas o que mais assusta é que o magistrado acredita que está certo e amparado pela lei”, disse Grossi.

A audiência desta semana foi marcada para realizar uma oitiva de testemunha e interrogar o réu do processo, um sargento da Polícia Militar, que atuou em uma ação da PM para dispersar um bloco de carnaval na Barra Funda, Zona Oeste de São Paulo, em 2019. Ele foi denunciado por quatro delitos: injúria, duas lesões corporais decorrentes de disparos de elastômero e ameaça.

“Duvido que o magistrado instalaria uma audiência virtual desde um leito hospitalar, usando cateter de oxigênio e camisola”, afirmou o criminalista, acrescentando que não vai divulgar se tomará providências sobre a situação.

Fotos de Grossi durante a audiência do hospital viralizaram nas redes sociais. Ele disse que, apesar de não ter sido ele quem divulgou o ocorrido, toda a solidariedade que tem recebido da classe é “incrível, um apoio necessário. Uma humanidade sem tamanho, que não recebi do magistrado”.

Em nota, a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil informou que “adotará as medidas cabíveis e necessárias para salvaguarda dos direitos e prerrogativas da Advocacia no episódio, em cumprimento ao estabelecido nos artigos 44 e 49 da Lei Federal nº 8.906/94”.

Já a Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais e a Associação dos Magistrados Brasileiros saíram em defesa do juiz que negou adiar a audiência por entender que Grossi “atua como assistente da acusação junto com outra advogada que, como ele, está igualmente habilitada a representar os interesses da acusação”.

No pedido de urgência enviado ao magistrado, Grossi alega que a outra advogada habilitada “não mais atua no processo; nunca, sequer, assinou uma petição. Aguardava-se a audiência para registrar a revogação de poderes em ata”.

JOTA


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