| 31 julho, 2020 - 18:00

O Direito e a amizade: repercussões – parte 02

 

Por Rodrigo Leite  Link da live de ontem (conseguimos, eu e o grande Prof. Luiz Dellore (@luizdellore),  abordar 5 das 13 divergências que listamos): https://bit.ly/3felgwx  Na primeira parte, abordamos os reflexos da amizade nas relações jurídicas, com ênfase no Processo Civil. Listamos alguns precedentes do STJ nos quais a Corte analisou a existência ou a ausência

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Por Rodrigo Leite 

Link da live de ontem (conseguimos, eu e o grande Prof. Luiz Dellore (@luizdellore),  abordar 5 das 13 divergências que listamos): https://bit.ly/3felgwx 

Na primeira parte, abordamos os reflexos da amizade nas relações jurídicas, com ênfase no Processo Civil. Listamos alguns precedentes do STJ nos quais a Corte analisou a existência ou a ausência da suspeição – link da parte 01: https://bit.ly/30KA94s 

O juiz suspeito tem o dever de abster-se do julgamento da causa. Verificando-se quaisquer hipóteses de suspeição, está o órgão proibido de participar do processo. Os motivos de suspeição são de índole pessoal, no sentido de que afastam a pessoa física do juiz do julgamento da causa, não tendo o condão de deslocar a competência para outro órgão jurisdicional. Reconhecida a suspeição do magistrado, nulos são os atos decisório por ele praticados em face da suspeição – nesse sentido: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2016, p. 279.  

Segundo Alexandre Freire e Thiago Rodovalho (Comentários…2016, p. 224) “a suspeição difere em grau de relevância em relação ao impedimento. Enquanto este é verdadeiro pressuposto processual negativo, de modo que não se sana com o decurso do tempo, a suspeição se traduz em hipótese que potencialmente podem pôr em xeque a imparcialidade do juiz. Trata-se, assim, de nulidade relativa. Sujeita-se, portanto, à preclusão de sorte que, não sendo alegada oportuno tempore (no prazo de 15 dias, a contar da ciência do fato, conforme estabelece o art. 146 do CPC/15), não mas poderá fazê-lo a parte interessada” 

De fato, a suspeição deve ser alegada e comprovada pelas partes na primeira oportunidade, sob pena de preclusão – vide art. 146 do CPC. Não há, por óbvio, preclusão para o juiz quanto ao reconhecimento da sua própria suspeição.  O juiz não só pode como deve reconhecer sua suspeição. Essa atuação que decorre do dever de lealdade é evidente, pois “a imparcialidade do magistrado é de índole pessoal e constitui pilar do princípio do juiz natural” (REsp 731.766/RJ, DJ 10/10/2005). Para o Superior, asuspeição alija o juiz de seu mister jurisdicional, abrangendo matéria de ordem moral de alta relevância a consubstanciar incredulidade acerca da própria dignidade do Poder Judiciário (RESp 582.692/SP, j.20/55/2010).  

No âmbito cível, o STJ decidiu que “as hipóteses de suspeição são taxativas e devem ser interpretadas restritivamente” (REsp 1783015/AM, Terceira Turma, DJe 18/05/2020). Ao examinar o art. 254, I, do CPP (que possui redação essencialmente parecida com a do CPC, sobretudo com o CPC/73), todavia, o Tribunal entendeu que “as causas de suspeição elencadas no artigo 254 do CPP são meramente exemplificativas” (REsp 1379140/SC, DJe 03/09/2013 e AgRg no AREsp 1053034/DF, Quinta Turma, DJe 27/10/2017).  

Entendo que a posição mais correta é a que considera que as hipóteses de suspeição não são taxativas, pois o legislador estabeleceu conceitos abertos, com grande margem de subjetividade (ver, por exemplo, há suspeição do juiz “interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes”), dando azo para que as hipóteses de suspeição sejam aferidas em cada caso concreto e não abstratamente.  

Também no Processo Civil, o art. 447 revela que todas as pessoas podem depor como testemunhas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas. O § 3º do Código considera que são suspeitos “o inimigo da parte ou o seu amigo íntimo”. Até é possível o juiz admitir o depoimento das testemunhas menores, impedidas ou suspeitas, mas tais depoimentos são prestados independentemente de compromisso, e o juiz lhes atribuirá o valor que possam merecer. Em disposição semelhante, o Código Civil prevê no art. 228, IV, que não podem ser admitidos como testemunhas “o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes.” 

Veda-se àquele que seja amigo íntimo ou inimigo de uma das partes deponha. A disposição tem uma razão óbvia: aquele muito próximo ou amigo de uma das partes certamente terá o depoimento comprometido pela relação amistosa ou afetuosa que possui com a parte. Poderá não revelar a verdade em virtude dos laços afetivos que possui ou poderá enaltecer a parte da qual é amiga. O inimigo, ao revés, poderia agravar, mentir, omitir ou prejudicar a parte com seu depoimento em virtude das rusgas ou da animosidade com a parte.  

Na terceira e última parte examinaremos a repercussão da amizade no contrato de transporte e no Código de Processo Penal


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