| 27 abril, 2020 - 15:12

Quem tem legitimidade para executar a pena de multa?

 

(Atentar para decisão do STF divulgada em 24.04.2020)

Por Rodrigo Leite

No passado, esse tema contava com divergência no STJ, o que foi examinado em nosso livro escrito com meu irmão Miguel Josino Neto (Análise das Divergências Jurisprudenciais no STF e STJ. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2011, p. 546), quando explicamos:

“Defendemos, apesar das vozes em contrário, que a execução das multas penais deveria se dar pela atuação do Ministério Público. Em que pese o art. 51 do Código Penal se referir que a multa  ali cominada possui natureza de dívida de valor, isto, por si só, não deveria retirar do Ministério Público a legitimidade para a execução das multas, respeitando, é claro, as regras das execuções fiscais. Filiamo-nos a esta posição, pois cremos que resultaria em maior efetividade nas execuções das multas do art. 51 do CP, pois a prática nos tem ensinado que a Fazenda Pública pouco realiza esse tipo de execução.”

Expomos a divergência que havia no STJ entre, por exemplo: o REsp 699.286/SP (que conferia legitimidade ao MP) e o AgRg no REsp 1027204/MG que conferia legitimidade à Fazenda Pública executar a multa penal.

A jurisprudência do Superior veio a se firmar no sentido contrário ao que defendemos. Editou-se a Súmula 521 com a seguinte redação: “a legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública”

Durante um tempo esse foi o entendimento pacífico do STJ sobre a matéria.

Houve, porém, uma mudança: ao examinar a matéria, o Supremo Tribunal Federal entendeu – tal como nós – que a multa possuía viés de sanção penal, o que *conferia legitimidade ao Ministério Público para executar as penas de multa*. Essa posição começou a florescer num dos inúmeros recursos interpostos no processo do Mensalão (AP 470).

Passou-se a compreender que o Ministério Público tem legitimidade, ainda que não exclusiva, mas prioritária, para cobrar a multa decorrente de condenação criminal transitada em julgado. A legitimidade da Fazenda Pública para propor execução fiscal é subsidiária, dependendo da hesitação do órgão ministerial dentro de prazo, foi fixado em 90 dias contados a partir da intimação para a execução da reprimenda. O Ministério Público é o órgão legitimado para promover a execução da pena de multa, perante a Vara de Execução Criminal, observado o procedimento descrito pelos artigos 164 e seguintes da Lei de Execução Penal; (ii) Caso o titular da ação penal, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de 90 (noventa) dias, o Juiz da execução criminal dará ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (Federal ou Estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria Vara de Execução Fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/1980. (ADI 3150/DF, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, DJe 06/08/2019).

Diante desse mais novo cenário, o STJ veio a (re)adequar sua jurisprudência e passou a entender que a legitimidade seria do Ministério Público e não da Fazenda, revigorando a posição que era minoritária no tribunal – ver RESp 699.286/SP, 08/11/2005.

Assim, “nos termos do novo entendimento desta Corte, firmado em consonância com o STF, no julgamento da ADI 3.150/DF, ocorrido em 13/12/2018, a Lei n. 9.268/96, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela o caráter de sanção criminal que lhe é inerente por força do art. 5º, XLVI, c, da CF. Como consequência, por ser uma sanção criminal, a legitimação prioritária para a execução da multa penal é do Ministério Público perante a Vara de Execuções Penais – AgRg no REsp 1855046/SP, julgado em 10/03/2020, DJe 16/03/2020).

No último dia 21 de abril de 2020, um NOVO CAPÍTULO ACERCA DESSE TEMA SE DESCORTINOU: o Plenário Virtual do STF modulou os efeitos da ADI 3150/DF para assentar que a Fazenda Pública tem competência concorrente nas execuções findas ou iniciadas até a data do trânsito em julgado da ADI 3150.

EM SÍNTESE: a legitimidade para executar as penas de multa é do Ministério Público (com a nova redação do artigo 51 dada pela Lei n. 13.694/2019 isso ganhou reforço e mais clareza), mas se admite a legitimidade concorrente da Fazenda Pública nas execuções findas ou iniciadas até a data do trânsito em julgado da ADI 3150.

Informação recentíssima e que certamente será objeto de reanálise pelos tribunais e tema de muitas provas.

Quer receber informações gratuitas pelo celular? Entre na minha lista de transmissão: 84-99431-2074.

Rodrigo Leite
Autor e coautor de 4 livros jurídicos
Mestre em Direito Constitucional
Professor da Pós de Civil on-line da Rede Kroton
Assessor de Desembargador do TJRN
Conteudista dos sites 
novodireitocivil.com.br (BA), justicapotiguar.com.br (RN), meusitejuridico.com.br (SP).


Leia também no Justiça Potiguar

2 Comentários
  1. Assis

    16/06/2020 às 14:13

    Boa tarde,
    Conheci o site pela matéria “Quem tem legitimidade para executar a pena de multa?”
    Uma questão que não foi oficialmente enfrentada é a prescrição da multa penal nas ações já iniciadas e de competência da Procuradoria, pois havia entendimento consolidado no STJ da natureza extrapenal da multa e por tal motivo aplicava-se o prazo tributário na lide.
    Ademais, muitos condenados tiveram benefícios na execução, por estarem diante do manto da extrapenalidade da multa. (Ex: extinção da pena privativa de liberdade sem o pagamento da multa e progressões de regime).
    O sistema mudou e muitos desses benefícios estão condicionados ao cumprimento da obrigação pecuniária.
    Acho que ainda dará muita discussão nos Tribunais.
    Veja o meu caso, fui preso em 2014:
    7 anos de semiaberto + 270 dias multa.
    Em 2016 progredi de regime, no mesmo ano fui agraciado pelo indulto e foi declarada extinta a punibilidade, sendo enviado a todos os cartórios e órgãos do governo a informação.
    Tirei passaporte, regularizei a situação eleitoral, tirei o nada consta criminal, em 2017 passei para a OAB, informei a condenação e fui inscrito nos quadros da instituição esse ano.
    Até a presente data a multa nem foi inscrita na dívida ativa.
    E só sei disso porque entrei no processo como advogado e tive acesso a tudo, à época nem fazia ideia o que era dias-multa e como se pagaria.
    Exponho só a título de curiosidade e amor ao debate, a multa é um tema espinhoso e claramente muito mal informado na advocacia criminal
    Abraço!

    Responder
  2. Erika

    25/09/2021 às 15:27

    Prezado Assis, comentando aqui para expressar admiração pela sua história e trajetória. Muito sucesso para vc, o que já deve ser realidade! Abraço.

    Responder

Comente esta postagem: