Enquanto juiz federal de Curitiba, Sergio Moro buscou se armar de muitos instrumentos para sua luta contra corrupção. Mas foi só depois de anunciar que vai deixar o Ministério da Justiça após a exoneração do chefe da Polícia Federal que Moro fez seus primeiros disparos de peso — inclusive contra o governo de Jair Bolsonaro.
“O presidente me falou que tinha preocupações com inquéritos no Supremo, e que a troca seria oportuna por esse motivo, o que gera uma grande preocupação”, disparou, ao anunciar sua renúncia.
Bolsonaro queria ter alguém do “contato pessoal dele [na PF] para poder ligar e colher relatórios de inteligência”, elencou Moro, nesta sexta-feira (24/4), durante coletiva de imprensa em que anunciou sua demissão do cargo.
A saída de Moro foi impulsionada pela exoneração do diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, publicada no Diário Oficial da União nesta madrugada. De acordo com o jornal Folha de S. Paulo, Moro pediu demissão na quinta (23/4) quando Bolsonaro comunicou a decisão de tirar Valeixo. Neste momento, Moro anunciou ao presidente que não ficaria no cargo se houvesse a saída do diretor-geral.
Em seu discurso nesta sexta, afirmou que entende indicações coletivas, mas elencou intervenções de Bolsonaro no funcionamento das instituições. “Quando se começa a preencher cargos técnicos de polícia com questões político-partidárias, o resultado não é bom para a corporação.” O problema, frisou Moro, não é quem entra na PF, mas por quê entra. “O problema é trocar o comando e permitir que seja feita a interferência política no âmbito da PF.”
Para parlamentares, a exoneração é uma forma de retaliação à manutenção da autonomia que Moro garantiu à PF. Para muitos, Bolsonaro não levou em consideração questões técnicas. O reflexo no horizonte político, claro, não é dos melhores, já que Moro se firmou como o ministro mais popular do governo.
Durante sua gestão do ministério, afirmou que tentou ser “garantidor da lei, da imparcialidade e autonomia das instituições”.
Ruídos
A exoneração de Valeixo soma-se aos episódios ruidosos na relação entre Moro e o presidente. Antes disso, a sanção presidencial do apelidado “pacote anticrime” já havia contrariado a maioria das propostas originais de Sergio Moro. A proposta de reforma no Código Penal e o Código de Processo Penal, que virou a Lei 13.964/2019, foi sancionada no apagar das luzes de 2019 e o texto aprovado pelo Congresso sofreu 25 vetos. A Casa Civil havia sugerido 38 vetos.
Em agosto também já havia tido um tensionamento quando Bolsonaro quis mudar o comando da Superintendência Regional da PF no Rio de Janeiro. De acordo com Moro, o próprio superintendente queria sair do cargo.
Alçado a figura de herói nacional contra a corrupção por julgar os casos da operação “lava jato” na 13ª Vara Federal de Curitiba, Moro aceitou o convite para assumir o Ministério da Justiça em novembro de 2018. À época, afirmou que via no cargo uma chance de “consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior”.
Hoje, na coletiva de imprensa, revelou que sua única condição para ingressar no MJ foi uma pensão para sua família caso algo acontecesse com ele. Relembrou ainda de seus 22 anos da magistratura.
A pasta era um dos superministérios do governo Bolsonaro, unindo as estruturas da Justiça, Segurança Pública, Transparência e Controladoria-Geral da União e o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
Conjur