No último dia 19, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ser “absurdo” o pagamento de pensões a filhas solteiras de ex-parlamentares e ex-servidores.
Entre os casos que surpreenderam Maia está o da pesquisadora Helena Hirata, que mora há 49 anos em Paris e recebe uma pensão mensal de R$ 16.881,50 apenas por ser solteira e filha de ex-deputado.
O parlamentar afirmou que vai trabalhar para que o Supremo Tribunal Federal mude a interpretação da lei que garante o benefício. Entretanto, é preciso ter cautela ao analisar a situação.
Isso porque há entendimento de que o benefício de pensão por morte é regido pela legislação vigente na data do óbito do instituidor da pensão; entendimento, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça — Súmula 416.
Nesse contexto, as pensões pagas as filhas solteiras de ex-parlamentares e ex-servidores são garantidas pela Lei n.º 3.373/58, que dispõe: “a filha solteira, maior de 21 anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente”.
Em outubro do ano passado, o ministro Edson Fachin, do STF, suspendeu os efeitos de acórdão do Tribunal de Contas da União que determinava a revisão ou cassação do pagamento dos benefícios.
Uma auditoria do TCU, de 2016, apontou suspeitas de fraudes em 19 mil pensões para filhas solteiras pagas em diversos órgãos da administração pública federal, não apenas do Legislativo.
O tribunal de contas alterou a interpretação da lei e obrigou que as pensionistas comprovassem a dependência do benefício para manterem o privilégio.
Fachin, na decisão monocrática do ano passado, observou que as pensões concedidas às filhas dos ex-servidores sob a égide da lei de 1958 encontram-se consolidadas e somente podem ser cessadas se um dos dois requisitos previstos na lei for superado, ou seja, se deixarem de ser solteiras ou se passarem a ocupar cargo público permanente.
“Assim, algumas situações não estão à mercê de interpretação, existem princípios que norteiam o direito e cabe ao Supremo Tribunal Federal garantir que sejam aplicados”, diz a advogada Fabiana Cagnoto, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
“Um exemplo desta situação, na prática, foi um caso recente, no qual conseguimos o restabelecimento da pensão à beneficiária M.C.A.B, filha solteira, que, amparada desde o ano de 1987, teve o seu benefício cessado no ano de 2017 em razão de ter possuído inscrição como microempreendedora individual nos anos de 1997 e 2000”, exemplificou.
“Na ocasião, comprovou-se que a beneficiária não incorreu em nenhuma das hipóteses previstas à época como causas extintivas da pensão, merecendo destaque a decisão proferida pela Turma Recursal do Juizado Especial Federal de São Paulo”:
Dessa forma, da análise dos documentos acostados aos autos, constata-se que a Requerente cumpre os requisitos exigidos em lei para a concessão do benefício, considerando que é maior de 21 anos (atualmente possui 59 anos), bem como é solteira, pois não há elementos nos autos a apontar para ocorrência de formalização de casamento ou união estável, e não ocupa cargo público permanente. Forçoso reconhecer, assim, que a Autora possui direito adquirido, com fulcro na lei vigente ao tempo do óbito do segurado, à percepção da pensão temporária, enquanto mantiver preenchidos os requisitos previstos naquela norma.”
“Portanto, há que se deixar de lado posicionamentos políticos, julgamentos pessoais acerca do justo e do injusto, bem como a interpretação evolutiva, que não podem ter o condão de modificar os atos perfeitamente constituídos sob a égide da legislação protetiva. O direito adquirido é respaldado pelo artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal e precisa ser respeitado”, completou a advogada
Em 1990, outra legislação pôs fim aos pagamentos, mas quem havia adquirido o direito o manteve. Para não perdê-lo, bastava permanecer solteira ou não ocupar cargo público permanente.
Para alguns congressistas, não há como mexer em direito adquirido. Ex-integrante da Polícia Militar, o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP) disse, ao jornal O Estado de S. Paulo, que vê o pagamento das pensões como herança do militarismo no país, em que mulheres e filhas eram totalmente dependentes dos maridos militares.
Conjur