O Tribunal de Justiça de Pernambuco gastou cerca de R$ 1 milhão em diárias para enviar 46 magistrados e servidores em maio deste ano a um treinamento de oito dias na Faculdade de Direito de Frankfurt, na Alemanha, com todas as despesas pagas pela corte.
O tribunal omitiu o valor total dos gastos e outros dados requeridos pela reportagem nos últimos meses. Ao reproduzir informações parciais do tribunal, a Folha publicou em maio que viajariam à Alemanha 25 magistrados e servidores.
Na ocasião, foi divulgado que “o tribunal premiou oito juízes, mas facultou a inscrição de outros 17 participantes: quatro desembargadores, nove juízes e quatro servidores, escolhidos pelo Conselho da Magistratura”.
Ao contrário de outros tribunais, que adquirem as passagens e registram os respectivos valores na página relativa à transparência, o TJ-PE informou que os selecionados receberiam oito diárias para cobrir os gastos com passagens, transporte terrestre, hospedagem e alimentação. Mas não informou o valor total.
Neste mês, a reportagem identificou no site do tribunal o pagamento de R$ 969 mil em diárias a 46 juízes e servidores no mês de maio. Em abril, o tribunal pagou o total de R$ 255,7 mil em diárias, e, em junho, R$ 306,4 mil.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, não quis comentar se esse gasto é condizente com as restrições orçamentárias do Judiciário. Na terça-feira passada (17), a reportagem voltou a procurar o TJ-PE para saber como o tribunal “explica o acréscimo de participantes e como justifica o gasto”. A corte estadual informou que não iria se manifestar.
ALÉM DAS METAS
Em 2018, o tribunal criou o programa “Muito Além das Metas”, inspirado numa resolução editada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2014, ainda na gestão do ministro Joaquim Barbosa.
Naquele ano, o CNJ criou a Política Nacional de Atenção Prioritária ao Primeiro Grau de Jurisdição, para estimular a produtividade nas varas ou seções onde atuam os juízes de direito, segmento mais sobrecarregado do Judiciário.
O programa do tribunal pernambucano também beneficiou desembargadores, ou seja, magistrados de segunda instância. Quando a viagem da comitiva a Frankfurt foi realizada, juízes concursados no TJ-PE ainda aguardavam nomeação.
Na primeira semana de junho, a reportagem requereu, com base na Lei de Acesso à Informação, os nomes dos juízes premiados e dos escolhidos pelo Conselho da Magistratura, além do custo total das diárias. Em julho, o tribunal informou que os dados solicitados estavam sendo enviados ao CNJ.
O assessor especial da presidência e coordenador científico do curso de extensão em Frankfurt, desembargador Sílvio Romero Beltrão, informou que “o próprio CNJ determinou que as referidas informações tramitassem em segredo de Justiça”, e que somente o CNJ poderia dar os detalhes sobre tais informações”.
O CNJ informou que a Corregedoria Nacional de Justiça vinha apurando os fatos desde abril deste ano.
Após inspeção ordinária (com relatório aprovado pelo colegiado), foi aberto pedido de providências (procedimento que corria em sigilo) para esclarecer o programa de premiação da Escola Judicial do TJ-PE.
O corregedor nacional publicou no Diário de Justiça Eletrônico do CNJ as seguintes determinações à presidência do TJ-PE: a) prestar informações, no prazo de 30 dias, acerca das premiações, das normas e dos custos fixados para o programa; b) “que a respectiva gratificação não seja utilizada para remunerar trabalho de natureza permanente e continuada”.
SIGILO SUSPENSO
Neste mês, o CNJ noticiou que “o TJ-PE esclareceu os fundamentos legais e regulamentares da premiação, bem como os critérios de classificação dos contemplados e o valor pago pela diária internacional, no montante de U$$ 691,00, para cada magistrado, conforme tabela de valor estabelecida pelo CNJ”.
No último dia 11, o corregedor determinou que o tribunal comprove —em dez dias— a efetiva participação de magistrados e servidores no curso de aprimoramento na Alemanha, fornecendo os certificados individuais de frequência.
Humberto Martins determinou que fosse retirado o sigilo do procedimento administrativo. “Não existe razão para restrição de acesso aos autos, que devem ser públicos”, afirmou em despacho. Mesmo com o sigilo retirado, a Corregedoria Nacional de Justiça e o Tribunal de Justiça de Pernambuco ainda não confirmaram o gasto total com a viagem à Alemanha.
Folha