| 2 julho, 2020 - 14:58

O fim da repercussão geral por omissão

 

Por Rodrigo Leite | Telegram: https://t.me/pilulasjuridicasSTFSTJ Na sessão administrativa de ontem, 1º de julho de 2020, o Supremo Tribunal Federal modificou seu Regimento Interno. Entre as alterações implementadas, destaco duas: o fim da repercussão geral por omissão (objeto dessa postagem) e o fim do voto por abstenção no plenário virtual (tema que será analisado outro dia). A repercussão

Fachada do Supremo Tribunal Federal. Brasilia, 26-10-2018. Foto: Sérgio Lima/Poder 360

Por Rodrigo Leite | Telegram: https://t.me/pilulasjuridicasSTFSTJ

Na sessão administrativa de ontem, 1º de julho de 2020, o Supremo Tribunal Federal modificou seu Regimento Interno. Entre as alterações implementadas, destaco duas: o fim da repercussão geral por omissão (objeto dessa postagem) e o fim do voto por abstenção no plenário virtual (tema que será analisado outro dia).

A repercussão geral foi introduzida na Constituição de 1988 por meio da Emenda Constitucional n. 45/2004 (Reforma do Judiciário) e, paulatinamente, foi sendo aperfeiçoada e detalhada nas legislações processuais com a finalidade de tentar levar ao STF, no recurso extraordinário, somente questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, ou que ultrapassassem os interesses subjetivos das partes.

De acordo com o Texto Constitucional, art. 102, § 3º, no recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo pela manifestação de 2/3 (dois terços) de seus membros.  Para ser recusada, a repercussão geral, necessitava-se da MANIFESTAÇÃO de OITO ministros do STF. O vocábulo utilizado é manifestação, o que para mim pressupõe uma conduta ativa.

Para o Regimento Interno do STF, o Tribunal recusará recurso extraordinário cuja questão constitucional não oferecer repercussão geral. O grande problema, porém, residia no art. 324, § 1º, que assim previa: “§ 1º Decorrido o prazo [referindo-se ao prazo de 20 dias do caput], sem manifestações suficientes para recusa do recurso, reputar-se-á existente a repercussão geral.”

A redação permitia que, caso um ministro não se manifestasse no prazo previsto no caput do art. 324 do RISTF, seu voto seria contabilizado como favorável à repercussão geral.

Seria uma espécie de repercussão geral por W.O., expressão derivada do inglês walkover e que nos eventos esportivos tem a conotação de vitória fácil em virtude do não comparecimento do adversário no local e no horário previstos (seria um without opponent).

A redação gerou debates intensos como os ocorridos no RE 584.247/RO, quando, em virtude da não manifestação expressa de alguns ministros, considerou-se de repercussão geral a competência do STF para julgar o pagamento de adicional de insalubridade para alguns servidores do ex-território federal de Roraima (alçado a Estado por meio da CR/88).

O dispositivo permitia a consagração de uma situação inusitada: a repercussão geral por omissão, pois decorrido o prazo previsto no art. 324 do RISTF, sem manifestações suficientes para recusa do recurso, consideraria-se a existência de repercussão geral.

A solução para esse impasse veio com a Emenda Regimental 54, de 1º/07/2020. Segundo a nova sistemática inaugurada pelo STF a repercussão geral do tema somente será analisada “se a maioria absoluta dos ministros reconhecer a existência de matéria constitucional. Quando houver maioria absoluta sobre a natureza infraconstitucional da matéria, a decisão terá os mesmos efeitos da ausência de repercussão geral, autorizando a negativa de seguimento aos recursos extraordinários sobrestados nas instâncias de origem que tratem de matéria idêntica.” Eis a nova redação do art. 324:

Art. 324.

§ 1º Somente será analisada a repercussão geral da questão se a maioria absoluta dos ministros reconhecerem a existência de matéria constitucional.

§ 2º A decisão da maioria absoluta dos ministros no sentido da natureza infraconstitucional da matéria terá os mesmos efeitos da ausência de repercussão geral, autorizando a negativa de seguimento aos recursos extraordinários sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica.

§ 3º O ministro que não se manifestar no prazo previsto no caput terá sua não participação registrada na ata do julgamento.

§ 4º Não alcançado o quórum necessário para o reconhecimento da natureza infraconstitucional da questão ou da existência, ou não, de repercussão geral, o julgamento será suspenso e automaticamente retomado na sessão em meio eletrônico imediatamente seguinte, com a coleta das manifestações dos ministros ausentes.”

Antes disso, como dito, a omissão de algum ministro contabilizaria voto a favor do reconhecimento da repercussão. Com a nova redação, se o ministro não se manifestar no prazo de análise de repercussão geral, sua não participação será registrada na ata de julgamento.

Além disso, estabeleceu-se que i) qualquer ministro, além do relator, poderá propor a reafirmação de jurisprudência dominante no Plenário Virtual; ii) o relator pode propor a revisão do reconhecimento da repercussão geral quando o mérito do tema ainda não tiver sido julgado; iii) o relator poderá negar a existência de repercussão geral com eficácia apenas para o caso concreto. Se houver recurso, a decisão deverá ser confirmada por 2/3 dos ministros para prevalecer.

Salutar modificação realizada pelo Supremo.

Abraço a todos!

Rodrigo Leite

Autor e coautor de livros jurídicos (Juspodivm e Saraiva)

Mestre em Direito Constitucional

Assessor de Desembargador do TJRN

Professor da Pós On-line de Civil da Rede Kroton

Conteudista dos sites justicapotiguar.com.br (RN), novodireitocivil.com.br (BA), meusitejuridico.com.br (SP) e supremotv.com.br (MG).


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