
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) determinou que a União faça reparações econômicas mensais e pague uma indenização de R$ 400 mil por danos morais por causa de perseguição, prisão e tortura que a ex-presidente da República Dilma Rousseff sofreu na ditadura militar. O acordão com o entendimento unânime da Corte foi disponibilizado nesta quinta-feira (18/12).
A condição de anistiada política foi tida como um fato incontroverso que já havia sido reconhecido pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania em um ato administrativo superveniente (em agosto de 2025), ou seja, tomado após o início do processo. A discussão central, então, passou a ser relativa às reparações devidas.
Dilma também já havia sido reconhecida como anistiada em diversos estados — Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo — por isso a União argumentava que novas reparações e indenizações configurariam bis in idem, ou seja, o Estado brasileiro estaria pagando duas vezes pelos mesmos fato.
O TRF1, no entanto, entendeu que se tratam de responsabilidades distintas e que as anistias estaduais não excluem a responsabilidade da União.
O acórdão aceita o argumento de que as anistias estaduais repararam atos de exceção cometidos por agentes daqueles estados específicos. Já a anistia federal baseia-se na responsabilidade política nacional da União em reconhecer o regime de exceção como um todo.
Além disso, foi estabelecido que os fundamentos jurídicos são distintos, com anistia federal tendo um caráter mais amplo de desculpas oficiais do Estado brasileiro e reparação integral, o que afasta a vedação de acumulação no Art. 16 da Lei de Anistia.
Dilma manteve as indenizações estaduais já recebidas e garantiu o direito à reparação econômica federal mensal (que corrige o valor de sua aposentadoria/pensão) e à indenização por danos morais paga pela União, pois estas cobrem a responsabilidade do Governo Federal pelas perseguições sofridas em âmbito nacional.
A tese da União de que o direito estaria prescrito foi rejeitada. O tribunal reafirmou que ações de danos morais por violação de direitos humanos na ditadura são imprescritíveis (Súmula 647 do STJ).
Para o relator do caso, o desembargador federal João Carlos Mayer Soares, a situação vivida pela então militante política foi de “excepcional gravidade”, “marcada por reiterados e prolongados atos de perseguição política, prisões ilegais e submissão sistemática da autora a torturas físicas e psicológicas praticadas por agentes em distintos órgãos repressivos e em diferentes Unidades da Federação, ao longo de extenso período”.
“Conforme detalhado nos depoimentos prestados ainda à época dos fatos e reiterados perante comissões oficiais de apuração, a autora foi submetida a sessões sucessivas de choques elétricos, pau-de-arara, palmatória, afogamento, nudez forçada, isolamento absoluto, ameaças de morte e de mutilação, privação de sono e de alimentos”, escreveu Soares.
Para o desembargador federal Flávio Jardim, que concordou totalmente com o relator do caso, o que Dilma sofreu “foi brutal, desumano e absolutamente inadmissível”.
Ele afirma, em seu voto, que os depoimentos desde a época dos acontecimentos, depois confirmados por comissões oficiais, mostram um “verdadeiro festival de crueldade”.
“Não se trata de excessos isolados, mas de uma sequência deliberada de atos de tortura, praticados com frieza, que deixaram marcas físicas permanentes — como danos na arcada dentária e hemorragias no útero — e feridas psicológicas profundas, típicas de quem foi submetido a tortura institucionalizada”, afirmou Jardim.
“É um retrato estarrecedor de violência estatal que não pode ser relativizado, minimizado ou esquecido”, disse ele.
Fonte: Jota