
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (9/12), no REsp 2.216.962, validar a doação de R$ 101 mil feita por uma dona de casa à Igreja Universal do Reino de Deus, revertendo decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) que havia anulado o repasse. Por 4 votos a 1, a maioria entendeu que contribuições motivadas por fé não se enquadram na doação típica prevista no Código Civil, e por isso não exigem escritura pública ou instrumento particular, mesmo quando envolvem valores elevados.
A fiel — que frequentou a igreja de 2006 até 2020 — contou que entregou o valor por acreditar nas promessas de prosperidade feitas por um pastor. O montante veio de parte de um prêmio de loteria recebido pelo então marido. Após o divórcio, ela ingressou com ação pedindo a anulação do repasse.
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, votou sozinho para negar provimento ao recurso da Igreja Universal. Para ele, o caso trata de uma doação de alto valor, categoria que a lei considera solene e que, portanto, só é válida se formalizada por escrito.
Cueva afirmou que não estava em jogo o caráter religioso do repasse, mas a exigência legal. “Para que a transferência se caracterize juridicamente como doação, é necessário que o negócio seja celebrado conforme determina a lei, sob pena de nulidade.”
O ministro também destacou que o cheque não substitui a forma escrita. “Se a forma escrita é da substância da doação, a sua existência jurídica dependerá necessariamente da forma prescrita.”
A divergência foi aberta pelo ministro Moura Ribeiro, que defendeu que contribuições religiosas — inclusive valores expressivos — não se encaixam no contrato de doação do Código Civil. Para ele, trata-se de um ato de liberalidade guiado pela fé, semelhante a esmolas, dízimos ou oferendas, no qual não se aplica a formalidade exigida para doações civis.
“Atos de voluntariedade, dever de consciência religiosa, demonstração de gratidão e fé não se enquadram na definição do contrato típico de doação”, afirmou Moura Ribeiro. Com esse entendimento, votou por dar provimento ao recurso e julgar improcedente a ação da fiel.
A ministra Daniela Teixeira acompanhou o voto de Moura Ribeiro e ressaltou que contribuições feitas a igrejas são expressão de compromisso religioso, e não doação civil. “Esse tipo de liberalidade não configura doação. Não dá para aplicar as normas do Código Civil a uma obrigação natural que a própria pessoa entendeu por bem praticar.”
A ministra Nancy Andrighi também seguiu a divergência. O ministro Humberto Martins destacou que a contribuição, quando motivada pela fé, não é equiparável a uma doação formal. “Dízimo não é pagamento; dízimo é devolução… motivado por fé e gratidão.”
Fonte: Jota