
Jornadas de até 15 horas diárias, e com apenas três dias de folga a cada 60 trabalhados, configuram dano existencial ao trabalhador.
Com esse entendimento, a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) condenou, por unanimidade, uma empresa ao pagamento de indenização no valor de R$ 5 mil a um motorista que fazia jornadas de trabalho extenuantes e sem direito a descanso semanal.
A decisão reformou parcialmente sentença da Vara do Trabalho de Primavera do Leste (MT), que havia rejeitado o pedido de indenização por dano moral.
No recurso, o trabalhador reiterou que as condições de trabalho ultrapassavam os limite físico aceitável, especialmente pela impossibilidade de retornar a sua residência por semanas seguidas.
Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora Eliney Veloso, esclareceu que o processo visa verificar se o empregado teve violados seus direitos fundamentais em razão das condições de trabalho. Segundo a magistrada, para a caracterização do dano existencial é imprescindível que o trabalhador comprove prejuízo concreto a sua vida social.
Sem dignidade
A prova oral confirmou que os motoristas transportavam milho e bagaço de grãos para uma indústria de biocombustível, e que permaneciam longos períodos sem voltar para casa.
Uma testemunha relatou que o trabalhador prestava serviço “de domingo a domingo, só descansando nos dias em que o veículo ia para a manutenção, bem como que a alimentação era feita na estrada, quando parava o veículo por cerca de 10 a 15 minutos”.
“Trata-se de circunstância que inequivocamente priva o trabalhador do contato com a família, do lazer e do efetivo descanso, que não pode ser realizado em cabines de caminhão por longos períodos”, escreveu a relatora.
O colegiado também analisou a jornada de trabalho do motorista. A empresa não apresentou controles de ponto e descumpriu seu dever de apresentar os registros de jornada, como determina a Súmula 338 do TST. Com base nos depoimentos, o TRT-23 manteve a condenação ao pagamento de horas extras e afastou a limitação imposta na sentença, que restringia o recebimento a apenas duas horas extraordinárias por dia.
Rescisão reconhecida
O TRT-23 manteve ainda o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. A empresa tentou reverter o entendimento alegando abandono de emprego, mas o colegiado afastou essa tese.
A ação trabalhista foi ajuizada em 20 de março de 2024, mas ficou comprovado nos autos que o motorista permaneceu trabalhando até 10 de maio do mesmo ano. “O ajuizamento de ação trabalhista postulando a rescisão indireta obsta a configuração do abandono de emprego, pois este pressupõe, além da ausência ao trabalho, o animus abandonandi”, afirmou a relatora.
Com a manutenção da rescisão indireta, a empresa foi condenada ao pagamento de verbas rescisórias como saldo de salário, aviso prévio, férias acrescidas de um terço, 13º salário, FGTS com multa de 40 por cento e liberação do seguro-desemprego, além da multa por atraso na quitação dos valores. Com informações da assessoria de imprensa do TRT-23.
Processo 0000225-82.2024.5.23.0076
Fonte: Conjur