
O Pleno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 0808853-93.2024.8.20.0000 proposta por entidades representativas do setor produtivo como a Federação das Indústrias (FIERN), Fecomércio, Faern e Fetronor e declarou inconstitucional a Lei Estadual nº 11.587/2023 e o Decreto nº 33.738/2024 que a regulamentava.
A norma previa que empresas privadas que recebessem incentivos fiscais ou mantivessem contratos com o Estado deveriam reservar no mínimo 5% de suas vagas de trabalho para pessoas travestis e transexuais. Também estabelecia critérios de preferência para pessoas trans em situação de vulnerabilidade social exigências de respeito à identidade de gênero no ambiente de trabalho e penalidades em caso de descumprimento.
Argumentos das entidades autoras da ação
As federações autoras alegaram que a legislação invadia a competência exclusiva da União para legislar sobre direito do trabalho (art. 22, I, da CF) e normas gerais de licitação e contratação (art. 22, XXVII, da CF).
Defenderam ainda que a medida violava o princípio da livre iniciativa (art. 170 da CF) ao impor obrigações trabalhistas desproporcionais ao setor privado. Argumentaram que a norma comprometia contratos já vigentes ferindo o ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI, da CF) e funcionava como majoração indireta de tributos ao atrelar benefícios fiscais ao cumprimento da cota sem respeitar o princípio da anterioridade tributária (art. 150, III, “b” e “c”, da CF).
Além disso apontaram risco de insegurança jurídica e prejuízo econômico especialmente para micro e pequenas empresas.
Defesa do Estado
A Governadora Fátima Bezerra (PT) e a Assembleia Legislativa do RN defenderam a constitucionalidade da norma argumentando que se trata de política pública de inclusão social semelhante a ações afirmativas existentes há décadas para pessoas com deficiência. Sustentaram que a medida buscava combater a exclusão histórica da população trans no mercado de trabalho e só atingia empresas que se beneficiavam de incentivos públicos.
O Ministério Público Estadual também opinou pela improcedência da ação defendendo a validade da norma.
Voto do relator e decisão final
O relator desembargador Claudio Santos apontou que a lei estadual trata diretamente de relações de trabalho e licitações matérias de competência privativa da União. Segundo ele a norma interfere na autonomia empresarial e gera impactos desproporcionais podendo forçar demissões de trabalhadores já empregados apenas para o cumprimento da cota.
Ele destacou ainda a ausência de estudos técnicos que justificassem o percentual de 5% e classificou a medida como arbitrária e descolada da realidade. Também criticou o decreto regulamentar por inovar ao criar obrigações e penalidades que extrapolam a própria lei em afronta ao princípio da legalidade (art. 5º, II, da CF).
Em seu voto afirmou que políticas afirmativas são legítimas mas devem respeitar os limites constitucionais ser embasadas em dados e implantadas de forma planejada e proporcional.
Por maioria de votos o TJRN declarou inconstitucional a Lei nº 11.587/2023 e o Decreto nº 33.738/2024. A decisão invalida a obrigatoriedade da reserva de vagas para pessoas trans nas condições previstas.