| 17 agosto, 2022 - 09:15

Cotas raciais em concurso para magistratura incorporam prática antifraude de tribunais

 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou, em abril deste ano, uma resolução para aperfeiçoar a principal política de ação afirmativa do Poder Judiciário, o sistema de cotas para negros nos concursos públicos dos tribunais. A Resolução CNJ n. 457/2022 determinou que os certames tenham uma comissão para confirmar a condição de negra declarada pela pessoa candidata

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou, em abril deste ano, uma resolução para aperfeiçoar a principal política de ação afirmativa do Poder Judiciário, o sistema de cotas para negros nos concursos públicos dos tribunais. A Resolução CNJ n. 457/2022 determinou que os certames tenham uma comissão para confirmar a condição de negra declarada pela pessoa candidata cotista no ato da inscrição. Os concursos para magistratura mais recentes revelam, no entanto, que o mecanismo antifraude já é uma prática corrente que acabou sendo incorporada pelo CNJ às novas regras nacionais para as seleções dos novos quadros da Justiça brasileira.

Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) foi um dos que se anteciparam à mais recente atualização das normas para concursos de magistrados e servidores. Desde 2018, os concursos para juiz substituto realizados pelo TJPR têm uma Comissão de Averiguação para atestar a veracidade da informação que cada candidato presta a respeito de sua raça. No concurso mais recente, iniciado em 2021, sete candidatos chegaram pela via das cotas raciais à fase da prova oral, quando a comissão de avaliação foi chamada a atuar.

A veracidade da autodeclaração entregue por seis candidatos foi confirmada pela comissão de avaliação. O sétimo preferiu não concorrer a uma das vagas das cotas raciais e acabou sendo aprovado na lista da chamada ampla concorrência, da qual participam todos que não tenham perfil – ou abram mão – de disputar uma vaga das cotas destinadas a pessoas com deficiência e pessoas negras. No resultado final do concurso, publicado no dia 5 de julho, quatro candidatos negros foram aprovados.

Reprodução

As cotas raciais como mecanismo de ingresso nas carreiras do Judiciário começaram a ser implantadas em 2015. À época, no entanto, o CNJ não especificou como os tribunais deveriam operacionalizar o sistema. Coube aos tribunais encontrar uma solução que garantisse efetivamente o direito de pessoas negras nos processos que selecionam os novos quadros da Justiça, prevenindo eventuais controvérsias a respeito do pertencimento racial de cotistas.

Em maio deste ano, o CNJ suspendeu – por decisão do Plenário no Procedimento de Controle Administrativo n.  0002371-92.20222.00.0000do, relatado pelo conselheiro Luiz Philippe Vieira de Mello – a posse de um candidato aprovado no concurso de juiz substituto do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) pelas cotas raciais, após uma comissão de especialistas e pesquisadores nomeada pelo próprio Conselho analisar o fenótipo do aspirante a juiz. A conclusão foi de que ele não fazia jus a uma das vagas das cotas para negros por não ter os requisitos exigidos pelo edital.

Para evitar a repetição de casos semelhantes, a Resolução CNJ n. 457/2022 exige que os tribunais instalem comissões de heteroidentificação na estrutura dos concursos, com integrantes que sejam “especialistas em questões raciais e direito da antidiscriminação”. Como a nova regra só se aplica a concursos abertos após a edição da resolução, o TJPR planeja ajustar a composição da sua comissão às exigências da norma nos próximos concursos, de acordo com o secretário da seleção, Carlos Eduardo Larcher dos Reis. A comissão de avaliação do mais recente concurso para juiz substituto do tribunal paranaense foi formada por uma magistrada que integrava a comissão do concurso e dois servidores negros da corte, incorporados a convite da organização.

Ajustes à vista

Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO), cujo mais recente concurso para ingresso na magistratura entrou nas fases finais, estuda a instituição de uma comissão de assessoramento que seria encarregada de casos controversos. Segundo o juiz Cristiano Mazzini, integrante da Comissão de Avaliação, alguns candidatos já consultaram a organização do concurso sobre quais regras prevalecerão, diante da recente resolução do CNJ.

A ideia agora é convidar magistrados, acadêmicos e personalidades da sociedade civil que tenham experiência na área para produzir pareceres sobre determinados candidatos que sejam alvo de pedidos de impugnação, para auxiliar o trabalho da comissão de avaliação que já existe. Como foi formada antes da Resolução CNJ n. 457, no entanto, seus integrantes não foram designados necessariamente pelo perfil de atuação no campo dos direitos raciais.

“Essa comissão de assessoramento faria um parecer técnico dessas questões que seria então submetido à comissão de avaliação. Dessa forma, respeita-se o edital, no nosso entender, pois é o documento que rege a relação entre tribunal e candidato. Ao mesmo tempo, inovamos também acolhendo o que o CNJ determinou, pois compreendemos que é mais seguro ir ao encontro do que o CNJ estabeleceu”, afirmou o magistrado.


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