Diálogos enviados pela defesa do ex-presidente Lula ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quinta (4) mostram os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato discutindo como evitar que o petista saísse da prisão por meio de habeas corpus concedido pela Justiça em 2018.
No dia 8 de julho daquele ano, um domingo, o desembargador Rogério Favreto, do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), atendeu a um pedido de advogados e determinou que Lula fosse solto.
Ele argumentou que o petista, embora condenado a mais de 12 anos de prisão, não tinha os direitos políticos cassados e por isso poderia fazer campanha eleitoral. Estaria ainda sendo submetido a constrangimento ilegal porque sua sentença ainda não tinha transitado em julgado. Favreto estava no plantão naquele dia.
A notícia foi recebida como uma bomba nos meios jurídicos e deu início a uma movimentação intensa dos procuradores e de magistrados para que ela fosse evitada. Os diálogos revelam os bastidores das iniciativas tomadas por eles. O desafio, naquele momento, era ganhar tempo.
Por isso, a Polícia Federal foi orientada a descumprir a ordem de Favreto, mostram as conversas. E, de fato, não soltou o ex-presidente.
O primeiro a se manifestar contra a soltura foi o então juiz Sergio Moro, que, embora de férias, deu um despacho afirmando que Favreto era autoridade “absolutamente incompetente” para se sobrepor à ordem de prisão, proferida pela 8a Turma.
O desembargador Favreto derrubou o despacho de Moro e deu uma hora para que sua decisão fosse cumprida pela PF.
O desembargador João Pedro Gebran Neto, que relatava o processo de Lula, teria entrado no circuito para orientar a PF a manter Lula na prisão.
Nos diálogos, o procurador Deltan Dallagnol escreve aos colegas: “Orientação do Gebran è que a PF solte se não vier decisão do presidente do TRF [a grafia foi mantida na forma original”.
Dallagnol afirma ainda que ele mesmo tinha entrado em contato os policiais: “Pedi pra PF segurar, mas predicávamos deneto dessa 1h ter sinal positivo. Pq eu dizer e nada não muda muito qdo tem ordem judicial”.
O procurador ainda afirma que “Moro tb não tem mais o que fazer “.
Em seguida, eles discutem pedidos e manifestações que podem apresentar para que Lula siga preso. E reconhecem a dificuldade da situação.
“Já enfrentamos desembargadores corruptos antes (Lipmann e Direcei). Aqui a questão parece ser ideológicoa”, diz o procurador Januario Paludo. “A posição do MPF tem que ficar clara nos autos. Há abuso de autoridade por parte do Desembargador Favareto”.
A esperança então recai sobre o então presidente do TRF-4, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, que poderia suspender a determinação de Favreto. “Por ora temos 30 min para fazer o Lenz se manifestar. Depois sim, dá para ir com tudo!”, diz uma procuradora.
Sem uma decisão de Thompson Flores, Lula poderia ser solto, mostram as conversas. “O problema é que Gebran disse pro Valeixo cumprir a ordem do Favretto se não vier contraordem tempestiva do president[e]”, escreve Deltan Dallagnol.
“Imprime e leva em mãos para o presidente”, diz a procuradora Jerusa Viecili. “Ou driblamos isso ou vamos perder”, segue Deltan.
Um pouco mais tarde, o procurador Januario Paludo acalma os colegas: “Waleixo [o superintendente da PF, Mauricio Valeixo] ligou. Lenz ligou para ele pedindo para aguardar a decisão dele”.
“Valeixo falou com Thompson que mandou não cumprir até ele decidir”, diz Deltan. “Isso nos dá mais tempo”.
Em seguida, ele afirma que a então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, teria se envolvido na movimentação. Ela teria telefonado para o então ministro da Segurança, Raul Jungmann, a quem a PF era subordinada, e pedido para Lula não ser solto.
“Carmem Lúcia ligou pra Jungman e mandou não cumprir e teria falado tb com Thompson. Cenário tá bom”, escreveu Deltan Dallagno.
Thompson Flores acabou suspendendo a decisão de Favreto e Lula seguiu preso.
A coluna enviou o trecho do diálogo a Jungmann, que afirmou se tratar de uma “mentira”.
Folha de S Paulo