Havendo suspeita fundada de crime, e existindo elementos idôneos de informação que autorizem a investigação penal do episódio delituoso, torna-se legítima a instauração de persecução penal, pois se impõe, ao Poder Público, a adoção de providências necessárias ao integral esclarecimento da verdade real, notadamente nos casos de delitos perseguíveis mediante ação penal pública incondicionada.
Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça acolheu uma denúncia do Ministério Público e tornou réu o promotor de Justiça de Presidente Prudente (SP), André Luís Felício. A esposa dele, a advogada Tatiana Cavalcanti Teixeira Felício, também foi denunciada, junto com outra advogada da região. Todos respondem por crimes de associação criminosa, corrupção passiva e concussão.
Segundo a denúncia, o promotor teria “abusado dos poderes do cargo público e violado os deveres a ele inerentes”, ao atuar para cooptar novos clientes para o escritório de advocacia onde sua esposa trabalhava. Além disso, ele teria assumido o compromisso de “patrocinar os interesses desses clientes perante a Promotoria de Justiça de Presidente Prudente”.
O MP diz que Felício identificava potenciais clientes (pessoas que estavam sendo investigadas pela Promotoria), solicitava ou exigia a contratação dos serviços advocatícios de sua esposa e, em troca, oferecia um “desfecho favorável” ao caso. Os honorários advocatícios eram divididos, conforme a denúncia, entre os trés réus do caso, ou seja, o promotor também recebia parte dos valores.
O relator, desembargador Ferraz de Arruda, considerou que a denúncia descreve detalhadamente os fatos e circunstâncias em que estes ocorreram, “como se depreende do relatório supra formalizado, permitindo clara compreensão bem como o oferecimento das defesas preliminares”. Para ele, estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 41, do Código de Processo Penal, o que justifica o recebimento da denúncia.
“Saliente-se que nesta fase processual, prevalece o princípio do in dubio pro societate, pelo qual, havendo indícios de autoria e materialidade delitiva a inicial deve ser recebida para apuração dos fatos e devida formação da culpa, não podendo o julgador, de pronto, cercear o jus accusationis do Estado, a menos que manifesta seja a ausência de justa causa para a ação penal”, afirmou.
No entendimento do desembargador, os depoimentos colhidos na fase investigativa e os documentos (incluindo recibos do recebimento de valores pelos réus) “formam indícios que dão sustentação à denúncia, de modo a exigir que melhor apuração dos fatos se dê no bojo da ação penal”.
O promotor está afastado do cargo desde abril de 2019 e também responde a uma sindicância no âmbito da Corregedoria-Geral do Ministério Público. Ele alega que a denúncia não possui nenhum “substrato probatório” e todo o procedimento investigativo se baseou apenas em prova testemunhal.
Além de receber a denúncia, o Órgão Especial levantou o sigilo do processo, que havia sido determinado em setembro do ano passado. A decisão foi por unanimidade. Agora, a ação penal vai tramitar perante o colegiado.