| 10 agosto, 2019 - 18:02

Veja quais são os desafios do próximo procurador-geral no governo Bolsonaro

 

Para a instituição, o desafio será preservar a independência e conviver com um procurador alinhado ao bolsonarismo

Os desafios

Foto: Assessoria MPF

Jair Bolsonaro vai escolher o novo procurador-geral da República. Neste século, o titular do cargo foi responsável por acusar os envolvidos no mensalão, denunciar o presidente da República por crime de corrupção e ajudar a moldar o modelo de cooperação internacional e de delação premiada que se tornaram a base da Operação Lava Jato. Diante do novo ocupante do cargo estarão processos como o que envolve o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o destino das forças-tarefas no Ministério Público Federal, a nomeação de alguns dos mais importantes cargos da instituição, além de um orçamento de R$ 4 bilhões.

Para a instituição, o desafio será preservar a independência e conviver com um procurador alinhado ao bolsonarismo – o presidente já deixou claro que esse será seu critério para a escolha – sem abandonar suas principais linhas de atuação nas últimas décadas: defesa dos direitos humanos, do meio-ambiente, dos povos indígenas e o combate à corrupção. Veja quais serão as principais tarefas diante do próximo procurador-geral e quem são os candidatos:

As forças-tarefas
O novo procurador-geral terá de lidar com o destinos das forças-tarefas do Ministério Público Federal no Brasil. Está no Conselho Superior da instituição um projeto feito pela Câmara do meio Ambiente que institui grupos permanentes regionalizados de atuação especial para delitos ambientes nos moldes dos grupos especializados que já existem nos Ministério Públicos Estaduais como os grupos de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (Gaecos). Caso seja aprovado, a experiência pode ser desdobrada para outras áreas, como o combate à corrupção e aos crimes contra a ordem econômica.

A questão envolve ainda um ponto crucial: quem vai indicar os integrantes de cada grupo? Se for o procurador-geral e o conselho superior, o poder da cúpula da instituição crescerá exponencialmente. Caso a tarefa fique nas mãos dos colégios locais de procuradores – como é atualmente com as forças-tarefas – haveria um freio e controle da classe em relação à distribuição desses cargos estratégicos, evitando os vícios de alguns Gaecos nos Estados. Também deve ser definido se os membros dessas forças terão mandato definido e ele poderá ser renovado ou se, uma vez designados passarão a contar com estabilidade – a chamada inamovibilidade -, o que os deixaria livre de pressões de cima e fora da instituição. Há quem defenda a mudança ainda dentro de um plano de reestruturação da instituição em razão da digitalização dos processos, da eficiência processual e da racionalidade dos recursos. Veja as principais forças-tarefas em andamento no MPF.

A pauta no STF
O futuro procurador-geral terá pela frente a defesa de dois pontos considerados fundamentais pela classe para o combate à criminalidade organizada no País: os julgamentos de ações no Supremo Tribunal Federal(STF) sobre o cumprimento de pena após condenação em 2.ª instância – como aconteceu com Luiz Inácio Lula da Silva – e a autorização de compartilhamento com o Ministério Público de dados recolhidos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Decisão do ministro Dias Toffoli, presidente do STF, paralisou todas as investigações que se haviam iniciado com dados do COAF< após pedido feito pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que teve os sigilos bancário e fiscal quebrados sob a suspeita de desviar dinheiro dos funcionários de seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio. Além desses casos, o novo procurador deverá se manifestar em temas importantes para a pauta bolsonarista, como a liberação do uso da maconha para fins recreativos e a portaria do ministro Sérgio Moro que determina a expulsão do País de estrangeiros considerados perigosos em um prazo de 48 horas.

2.ª Instância
Adiado pelo ministro Dias Toffoli após pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o julgamento da ação que definirá se um réu deve ser preso após condenação em 2.ª instância pode ser retomado neste segundo semestre no STF. Não há, no entanto, uma data marcada para que ele entre na pauta.

COAF
Decisão do ministro Dias Toffoli suspendeu em todo o País as investigações em curso em que houve compartilhamento de dados do Coaf. A medida, segundo procuradores especializados no combate ao crime organizado, paralisou as apurações de lavagem de dinheiro beneficiando organizações como o Primeiro Comando da Capital e políticos corruptos.

Maconha
Dias Toffoli retirou da pauta do STF, por enquanto, a ação que devia levar a liberação do uso da maconha no País. A medida é criticada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas contava com o apoio da maioria dos ministros do STF, que pretendiam estabelecer ainda quantidades da droga que cada usuário poderia manter consigo sem ser considerado traficante.

Lula X Moro
O STF deve analisar ainda neste segundo semestre o recurso da defesa do ex-presidente que pede o reconhecimento da parcialidade do juiz Sérgio Moro ao julgar e fazer a instrução de seus processos em Curitiba. O principal argumento é o conteúdo de conversas interceptadas por hackers entre Moro e o procurador da república Deltan Dallagnol.

Fake News
O plenário da Corte vai analisar a legalidade e determinar a continuidade ou não do inquérito presidido pelo ministro Alexandre de Moraes que apura as chamadas fake news e ameaças contra ministros do STF. Raquel Dodge já se manifestou contra o prosseguimento das investigações sem o acompanhamento do MPF.

Nomeações
Dezenas de cargos importantes na Procuradoria Geral da República dependem do procurador-geral. Mas nem todos. A Lei Complementar 75 (sobre a organização e atribuições do Ministério Público da União) divide esse poder entre o procurador-geral e o Conselho Superior da instituição. Mas ao chefe do MPF cabe nomear o vice-procurador-geral e o vice-procurador-geral eleitoral. Cabe a ele ainda indicar o procurador federal dos direitos do cidadão – ouvido o Conselho Superior – e um de cada três membros efetivos e suplentes das Câmaras de Coordenação e Revisão do MPF, que cuidam da atuação do órgão em áreas como meio ambiente, combate à corrupção e à delitos contra a ordem econômica. O procurador-geral e o vice-procurador-geral são membros natos do Conselho Superior.

Quatro outros integrantes são eleitos por toda a classe e quatro somente pelos subprocuradores-gerais. Esses oito membros já foram eleitos – quatro deles estão no meio do mandado e quatro tomaram posse na sexta-feira. destes, cinco são ligados ao grupo do ex-procurador-geral Rodrigo Janot e um é próximo ao subprocurador-geral Mário Bonsaglia, primeiro colocado na lista tríplice elaborada pelos procuradores em eleição feita pela Associação Nacional dos Procuradores de Justiça. Veja aqui os principais cargos da instituição.

Procurador-geral República
É o representante do Ministério Público Federal que atua no Supremo Tribunal Federal e, por isso, cabe a ele processar as autoridades com foro, como o presidentes da República, da Câmara e do Senado. É ainda o chefe do Ministério Público da União, que engloba os Ministérios Públicos Militar, do Trabalho e do Distrito Federal.

Vice-procurador-geral
É o responsável por delegação do procurador-geral dos caso da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que analisa os casos criminais envolvendo desembargadores e governadores dos Estados. É ainda responsável por substituir o procurador-geral no STF.

Vice-procurador-geral eleitoral
É o responsável pelos casos de crimes eleitorais julgados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), exceto os caso que envolvam o presidente da República, que permanecem nas mãos do procurador-geral de Justiça

Procurador federal dos direitos do cidadão
É o responsável por verificar “zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”. Entre os direitos individuais que ela deve cuidar estão a liberdade, igualdade, saúde, educação, assistência social, acesso à justiça, direito à informação e livre expressão, reforma agrária etc.

Conselheiro do MPF
Com dez integrantes, o conselho é o órgão máximo de deliberação do MPF. Entre suas atribuições estão definir promoções por mérito, aprovar as normas para concursos de ingresso no MPF,, determinar a realização de correições e sindicâncias. É ele que elabora lista tríplice de nomes para o cargo de corregedor-geral do MPF, entre os quais o procurador-geral deve escolher o ocupante do cargo, além de elaborar critérios para a distribuição de inquéritos para procuradores. Também elege dois dos três integrantes de cada Câmara de Coordenação de Revisão.

Membros das Câmaras de Coordenação e Revisão
As Câmaras de Coordenação e Revisão (CCR) do Ministério Público Federal são compostas por subprocuradores-gerais e são os órgãos setoriais que coordenam, integram e revisam o exercício funcional dos membros da instituição – procuradores e subprocuradores da República. São organizadas por função ou por matéria. Existem sete: Direitos sociais e fiscalização de atos da administração em geral, criminal, consumidor e ordem econômica, meio ambiente e patrimônio cultural, combate à corrupção, populações indígenas e comunidades tradicionais e controle externo da atividade policial e sistema prisional.

Orçamento
O Ministério Público Federal está em uma encruzilhada. pego no contrapé pela Emenda Constitucional 95 – a que criou o teto de gastos no setor público – o MPF precisa controlar seus gastos. É que em 2016, ano-base para os cálculos feitos pela emenda, a instituição estava em contenção de gastos para fazer sua expansão no ano seguinte. Agora, o MPF planeja fechar sede no interior do País – já foram fechadas sedes no interior do Paraná, Santa Catarina, Minas e São Paulo – e aposta na digitalização de processos para rearranjar sua estrutura. Atualmente cerca de 85% do orçamento do órgão é gasto com despesas obrigatórias – salários, por exemplo – e 15% com as chamadas despesas discricionárias, como a reforma de sedes, compras de equipamentos e viagens. A necessidade de conter despesas ao mesmo tempo em que as mudanças causadas pela digitalização dos processos judiciais leva os procuradores e defender o pagamento de gratificação por trabalho à distância, o que não foi aceito neste ano após empate de 5 a 5 em votação no Conselho Superior do MPF. Na sexta-feira, o conselho votou o orçamento da instituição para 2020.

Os candidatos
São seis os procuradores que têm alguma chance de serem indicados pelo presidente Jair Bolsonaro para o cargo: os três que compõe a lista tríplice feita pela Associação Nacional após eleição da categoria – Mario Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Balu Dalloul -, a atual procuradora-geral Raquel Dodge e os subprocuradores-gerais Augusto Aras e Paulo Gustavo Gonet Branco. Candidatos mais à esquerda no MPF não se candidataram desta vez ao cargo, como o subprocurador-geral Nicolao Dino. E, pela primeira vez, a categoria colocou no primeiro lugar da lista da associação – por meio da qual são eram escolhidos, embora não fosse uma determinação legal, os procuradores-gerais desde 2003 – um procurador conservador: Mario Bonsaglia.

Estadão


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