“É impossível devolver a liberdade perdida ao cidadão”, afirmou o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, ao votar pela autorização da execução da pena apenas após o trânsito em julgado do processo.
“Não se pode assentar a culpa para além dos limites expressos na Lei Maior, quando o próprio processo criminal é afastado do controle deste Tribunal. Em resumo, suprime-se, simultaneamente, a garantia de recorrer, solto, às instâncias superiores e o direito de vê-la tutelada, a qualquer tempo, pelo Supremo”, argumentou o ministro.
Marco Aurélio é o relator das três ações declaratórias de constitucionalidade sobre a execução antecipada da pena, que voltaram a ser debatidas pelo Plenário nesta quarta-feira (23/10). O julgamento foi suspenso e volta na tarde de hoje.
O ministro mantém seu posicionamento histórico no sentido de que a execução da pena só pode ser autorizada após trânsito em julgado.
“A harmonia, com a Constituição de 1988, do artigo 283 do Código de
Processo Penal é completa, considerado o alcance do princípio da não
culpabilidade, inexistente campo para tergiversações, que podem levar ao retrocesso constitucional, cultural em seu sentido maior”, disse.
Assim como o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, o ministro Marco Aurélio também recorreu, em seu voto, ao argumento do superencarceramento dos presídios brasileiros.
“O problema adquire envergadura maior quando considerada a superlotação dos presídios. Constatou-se o exorbitante número de cidadãos recolhidos provisoriamente, a salientar a malversação do instituto da custódia cautelar e, consequentemente, a inobservância do princípio da não culpabilidade. Inverte-se a ordem natural para prender e, depois, investigar”, disse.
Segundo o ministro, atualmente conduz-se o processo criminal com automatismo “incompatível com a seriedade do direito de ir e vir das pessoas”.
O relator julgou procedentes as ações, pela constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal. Como consequência, determinou a liberdade dos que foram presos neste grau recursal, com as ressalvas para prisões preventivas e temporárias.
Os 11 ministros da Corte vão decidir se mantêm ou não o atual entendimento jurídico de que o réu pode ser preso após condenações em segunda instância.
Esgotamento dos recursos
Marco Aurélio liberou as ações para julgamento no final de 2017. A presidente do Supremo na ocasião, ministra Cármen Lúcia, evitou colocá-las na pauta do plenário, o que gerou críticas de parte de seus colegas e, em especial, de Marco Aurélio.
Ele é um dos mais ferrenhos defensores da tese de que a Constituição exige que se esgotem todos os recursos antes da execução da pena de um condenado.
Desde que assumiu a relatoria das ações, que começaram a chegar ao STF em 2016, o ministro tem indicado que votaria por declarar constitucional o artigo 283 do Código de Processo Penal, segundo o qual ninguém pode ser preso exceto em flagrante ou se houver “sentença condenatória transitada em julgado”.
Caso
A OAB e dois partidos políticos pedem que o STF condicione o início do cumprimento da pena ao esgotamento de todas as possibilidades de recurso — o trânsito em julgado. A discussão é em torno da constitucionalidade do artigo 283 do CPP, que estabelece:
“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.
Conjur