O Tribunal Pleno do TJRN julgou como inconstitucional a Lei n. 531/2018, editada pela Câmara Municipal de Natal, que instituiu o programa “Bairro seguro”, na qual se autorizava o bloqueio ou fechamento de ruas localizadas na capital. Normativo esse que, conforme o julgamento, incorre na inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, em afronta ao artigo 61, da constituição federal e, por simetria, os artigos 2º e 46, da constituição potiguar, ao estabelecer novas atribuições à Secretaria municipal de Transporte e Trânsito Urbano – STTU e à administração municipal direta.
O julgamento apenas registrou divergências quanto ao prazo de 60 dias para se desfazer as limitações de acesso às vias públicas fechadas pelo condomínio que as executou. A divergência se deu diante do entendimento dos desembargadores Dilermando Mota, Zeneide Bezerra, Glauber Rêgo, Lourdes Azevêdo e Amílcar Maia, no sentido de que o Poder Público deve arcar com os custos. O que não foi entendido pela maioria.
De acordo com a decisão, a matéria é de iniciativa legislativa do chefe do poder executivo e tal lei – ao permitir que moradores de uma determinada região, bairro ou localidade, restrinjam o livre ingresso de indivíduos através da instalação “autorizada” de bloqueios físicos – afronta diretamente a garantia constitucional de livre locomoção em território nacional. Desta forma, o dispositivo, conforme o colegiado decidiu, por unanimidade, é incompatível com as diretrizes das políticas urbanas insertas no artigo 116, da Constituição estadual.
Condomínios de fato
O voto do relator ainda ressaltou que, nas últimas décadas, se intensificou o surgimento de loteamentos chamados de “condomínios de fato”, com uma modalidade diversa daquela originariamente disciplinada pela Lei 6.766/1979. “A partir do seu fechamento por muros ou cercas e a instalação de mecanismos de controle de acesso (portarias ou cancelas), as áreas primitivamente públicas ficaram restritas ao usufruto dos indivíduos residentes nas áreas intramuros”, esclarece.
A decisão ainda ressaltou que a mudança tem a subscrição de 85% dos moradores da localidade, deixando de observar que as ruas municipais, por serem bens de uso comum do povo, têm por objetivo específico servir à livre circulação, ao livre trânsito e à livre locomoção de pessoas (ainda que por meio de veículos automotores).
“Em outras palavras, as vias municipais asseguram o direito constitucional fundamental de ‘ir e vir’ do cidadão em geral”, define o desembargador Gilson Barbosa, ao citar o entendimento de juristas sobre o tema.
O relator acrescenta que, diferente de outros julgamentos, a Lei impugnada não se busca a regularização de loteamentos fechados a serem implantados na municipalidade, diversamente, cria uma autorização para que, em ruas hoje de regular circulação comum a todos, possam ser instaladas barreiras (muros, guaritas, cancelas) por liberalidade de 85% dos moradores ali residentes, pelo que inaplicáveis as conclusões lançadas em decisões anteriores.
“São diferentes do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2014.025826-4, da Relatora do Desembargador Amílcar Maia, e na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2010.005200-0, de minha relatoria”, pontua Gilson Barbosa.
(Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 0802791-42.2021.8.20.0000)